A Indústria Conserveira na Construção da Malha Urbana no Algarve: CONSIDERAÇÕES FINAIS e BIBLIOGRAFIA
A Indústria Conserveira na Construção da Malha Urbana no Algarve: CONSIDERAÇÕES FINAIS e BIBLIOGRAFIA
Armando Filipe da Costa Amaro
0. INTRODUÇÃO 10
0.1 Objeto 10
0.2 Objetivos 10
0.3 Pertinência/Motivações 10
0.4 Cronologia 10
0.5 Estado da Arte 11
0.6 Metodologia 16
0.1 Objeto
As relações arquitetónicas e urbanísticas, da indústria conserveira, com as urbes algarvias.
0.2 Objetivos
Objetivos Gerais:
Estudar as relações estabelecidas, ao longo do tempo, entre a indústria conserveira e as malhas urbanas, das cidades onde estas se estabeleceram.
Contribuir para o conhecimento sobre esta fase industrial no Algarve, e para a desmistificação do Algarve como uma região que sempre subsistiu do turismo, valorizando o património arquitetónico industrial.
Objetivos Específicos:
Estudar a localização do edificado conserveiro, ao longo do tempo, e as suas estruturas produtivas.
Identificar e analisar as construções e os programas arquitetónicos habitacionais e outros complementares à indústria de conservas.
Estabelecer relações entre a localização dos edifícios da indústria de conservas e o desenvolvimento da infraestrutura urbana.
0.3 Pertinência e Motivações
A paisagem litoral do Algarve é pontuada por chaminés de antigas fábricas; a convivência com esta realidade despertou interesse face a esta constatação, referente ao séc. XX, espelho de um Algarve industrial, que é hoje somente uma miragem. Compreender a dimensão desta indústria, no tecido urbano da região e a forma como moldou ou influenciou as cidades que hoje conhecemos, permite divulgar e preservar um património industrial que vai para além da materialidade das antigas fábricas, hoje, em ruínas, sendo só por si essa uma grande motivação.
Sobre este período restam, ainda, estudar várias perspetivas, para as quais este trabalho pretende ser um contributo. A falta de estudos para o período de 1900-1960, sobre a influência da indústria conserveira e a sua relação com os núcleos urbanos do Algarve, juntamente com todas as transformações que provocou, não apenas a nível urbano mas também no modo de habitar da população operária, abrem espaço para a relevância de trabalho como este que aqui se propõe.
0.4 Cronologia
A indústria conserveira atingiu a sua estabilidade, bem como o seu auge, na primeira metade do séc. XX. Por essa razão, esse espaço temporal define-se como mais apropriado para estudar as relações urbanas e arquitetónicas que a indústria desenvolveu. O período estabelecido para o estudo deste trabalho, 1900-1960, prolonga-se uma década para possibilitar o estudo equitativo dos Anteplanos de urbanização, nos vários casos de estudo. Esta documentação, sobre as cidades em estudo, torna-se indispensável pela sua análise e ponto de situação, entre 1944 a 1960.
0.5 Estado da Arte
O tema da indústria conserveira em Portugal desperta, ainda hoje, o interesse em várias áreas do conhecimento e, também, a nostalgia de alguns que guardam na sua memória o tempo em que várias fábricas de conserva de peixe laboravam simultaneamente ao longo do litoral português. Existem várias publicações que abordam o tema, mas muitas não vão além de replicar o contexto histórico em que este se inseriu, concentrando-se numa perspetiva sociológica dos operários conserveiros. Outras, mais recentes, tentam contribuir para o campo da arqueologia industrial, identificando as fábricas e a sua localização com maior ou menor sucesso. No panorama geral, identifica-se uma clara lacuna dentro do tema: a análise urbana e arquitetónica. Por outras palavras, o estudo da industrialização e as suas consequências transformadoras, no desenho da cidade. Escassa é, também, a investigação no que diz respeito ao crescimento populacional dentro das cidades, um dos maiores sintomas da industrialização, como o estudo da habitação operária.
Existem, no entanto, publicações de relevo que servem de exemplo: um dos mais importantes documentos para o tema é “A indústria de conserva de peixe no Algarve (1865-1945)”, de Joaquim Rodrigues, trabalho bastante completo onde é referido todo o contexto histórico nacional e regional, identificação de fábricas de conserva nos diferentes centros conserveiros, habitação operária e análise económica e produtiva. A abordagem do historiador é, no entanto, diferente da deste trabalho, que além da perspetiva urbana e arquitetónica, foca-se, sobretudo, em quatro centros conserveiros e não em todos os da costa algarvia.
Além de realizar uma abordagem mais completa do problema da habitação neste período e da identificação das soluções apresentadas. No que diz respeito à forma, a publicação “Caminho Do Oriente: Guia do património Industrial” de Deolinda Folgado e Jorge Custódio, é a que mais se aproxima, pelo formato, onde o contexto histórico identifica as relações entre a indústria e a transformação urbana, portuária e viária, localizando as zonas industriais. A perspetiva que a análise, identificação e divulgação de um contexto ou de um edifício é antes de qualquer outro meio, uma forma de preservação, é uma abordagem com a qual este trabalho se identifica. No que diz respeito ao exercício de arqueologia industrial, presente na dita publicação, onde se identificam os vários edifícios industriais da zona em estudo, tornou-se também um exemplo, devido à inexistência de informação suficiente (como ficará explanado neste trabalho), pelo que foi necessário fazer esse exercício de forma complementar a este estudo.
A perspetiva arquitetónica, do trabalho académico de Hugo Cerqueira “Aspectos do Movimento Moderno na Arquitectura da Indústria Conserveira: A fábrica nº6 da Algarve Exportador Limitada” é uma abordagem diferente dos demais trabalhos referidos. Destaca-se pela contextualização arquitetónica industrial, a ligação entre as “cetárias” romanas com os locais onde se instalam os centros conserveiros modernos e a identificação de três tipologias dos edifícios utilizados pela indústria conserveira, ao longo do tempo, importante na identificação destes edifícios e da sua transformação. A abordagem culmina na análise do edifício da fábrica da empresa Algarve Exportador, em Matosinhos, e difere da que é proposta neste trabalho, mas não deixa de ser um trabalho relevante para o estudo da indústria conserveira e que oferece contribuições importantes para este trabalho, pelo facto de conter plantas das várias instalações da empresa, inclusive da fábrica de Lagos.
O tema da habitação para operários e restantes classes trabalhadoras economicamente mais desfavorecidas, anda a par com a industrialização das zonas urbanas e por essa razão foi incontornável o seu estudo. Assim, foi indispensável a leitura da publicação “HABITAÇÃO: Cem anos de políticas públicas em Portugal (1918-2018)” do Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana, que identifica todos as medidas estatais para a promoção de habitação ao longo do tempo, sendo por isso importante para a identificação de bairros que tenham sido construídos sobre a alçada dessas iniciativas nos casos de estudo. Nesse sentido, este trabalho contribuirá para a identificação da aplicação dessas mesmas iniciativas, no território algarvio sobre o qual existem poucos estudos divulgados. Para o contexto histórico das soluções habitacionais da população industrial importa referir, ainda, “As estratégias de habitação em Portugal, 1880-1940” de Manuel Teixeira, pela relevante menção às primeiras reações à industrialização em Portugal, nas cidades de Lisboa e Porto, bem como a referência às consequências urbanas e públicas, assim como às soluções encontradas (como as “ilhas”, “pátios” e “vilas”). O trabalho “A indústria conserveira e a evolução urbana de Setúbal (1854-1914)”, de Ana Alcântara, permite compreender a dicotomia entre as duas principais cidades do país (Porto e Lisboa) e Setúbal, vila pioneira na instalação de fábricas conserveiras em Portugal. Esta desenvolveu-se através do aumento exponencial do número de fábricas que nela se instalaram e, como tal, serve de exemplo das consequências da industrialização para a habitação num centro conserveiro. O padrão observado em Lisboa e Porto, mas principalmente em Setúbal, permite compreender, no contexto nacional, o caso do Algarve e estabelecer paralelismos temporais e programáticos, ainda que a escala urbana e do número populacional entre os exemplos e os casos de estudo sejam diferentes.
Da literatura complementar sobre a região do Algarve, que refere os locais em estudo, destaca-se o livro “O Algarve da Antiguidade aos nossos dias: elementos para a sua história”, com a coordenação de Maria da Graça Maia Marques, que contempla vários artigos sobre o crescimento da população algarvia no período em estudo, assim como relativos aos movimentos migratórios da população na região, e ainda sobre dois grandes industriais da região, Júdice Fialho e Caetano Feu, entre outras particularidades sobre a industria na região. No que respeita à transformação das estruturas portuárias, importa referir: “Os Portos Marítimos de Portugal e Ilhas Adjacentes” de Adolpho Loureiro, que faz referência a diversos projetos para os portos do país, tendo plantas, cortes e outros desenhos ilustrativos dos projetos concretizados, tornando-se muitíssimo útil na análise e contextualizam as zonas portuárias dos casos de estudo no início do séc. XX. E ainda, o “Estudo Geral Económico e Técnico dos Portos do Algarve” de Duarte Abecasis, onde é feita uma importante análise das condições portuárias, assim como das expetativas de desenvolvimento de cada um dos portos, permitindo contextualizar a realidade nos anos 20 do século XX e dos centros conserveiros.
O documento refere, ainda, o número de fábricas em laboração no ano do estudo, para alguns locais, descrevendo a importância do caminho de ferro para a estrutura produtiva, e lançando a ideia de uma possível ligação ferroviária entre Sines e o Algarve, projeto que não se concretizou.
Outro documento importante, mas que apenas se refere ao sotavento algarvio, é “O Algarve oriental: as vilas, o campo e o mar” de Carminda Cavaco, que faz uma análise da indústria conserveira na região. Refere as deslocações pendulares dos trabalhadores entre as aldeias periféricas e os centros conserveiros, identifica as primeiras fábricas da região e menciona as indústrias subsidiarias à produção de conservas, entre outros temas complementares.
Todos estas publicações são importantes para a compreensão das transformações e dinâmicas que ocorrem na região e, em particular, nos centros conserveiros em estudo. A sua relevância para o entendimento do processo de transformação dos aglomerados urbanos, bem como das estruturas viárias e portuárias é, ainda, maior pela ausência de estudos que se foquem nestes temas sob uma perspetiva arquitetónica ou urbana e que se expressem através de elementos gráficos, escassos para este período em estudo. Por estas razões, este trabalho serve como complemento a estes estudos, apontando e contextualizando as transformações referidas na literatura referida, assim como outras que foi possível identificar.
0.5.1 Lagos
Para o caso de estudo da cidade de Lagos, destaca-se o livro “A Evolução Urbanística de Lagos (Séculos XV-XVIII)” de Daniela Pereira, que faz um estudo expositivo da evolução da malha urbana da cidade e contextualiza as suas transformações, apesar de não englobar o século XIX. Ainda assim, trata-se de um documento completo, com esquemas e elementos gráficos que nos permitem traçar o padrão de evolução da cidade. A publicação “Lagos, Evolução Urbana e Património”, com coordenação de Rui Paula, recebe também aqui um destaque importante para o presente trabalho, por força do contributo da sua síntese evolutiva, da antiguidade até ao século XX, onde são destacados os pontos mais relevantes de cada período, para a cidade. Também os desenhos, bem como as descrições das alterações e construções de estruturas ferroviárias e portuárias, equipamentos, assim como de outras alterações urbanas de relevo, como o loteamento do Rossio de S. João, nos anos vinte, são merecedores de destaque. Neste documento é possível, ainda, encontrar uma planta onde estão assinalados locais onde as fábricas de conserva da cidade laboraram, embora sem qualquer suporte descritivo, referências bibliográficas ou fontes. Em geral, embora o documento se apresente como um resumo, é um documento único, principalmente devido à quantidade de documentação gráfica e, por isso bastante relevante, deixando, no entanto, espaço para o aprofundamento e verificação de alguns documentos, com evidência para o mapa da localização da indústria conserveira.
Este trabalho pretende contribuir para a análise da evolução urbana da cidade, continuando o trabalho da historiadora D. Pereira (2017), bem como de aprofundamento e esclarecimento, no que respeita à publicação do arquiteto e urbanista R. Paula (1992). Para esse efeito, foram ainda relevantes “Mulher: operária conserveira” publicação da Câmara Municipal de Lagos, que aborda a indústria conserveira na cidade, do ponto vista histórico e social, contendo uma atualização (ou uma revisão) do mapa de localização da indústria conserveira de R. Paula (1992), mas não apresentando qualquer suporto descritivo, fontes ou bibliografia associados, ou autor do elemento gráfico. Devido à falta de elementos fidedignos da localização da indústria em publicações, caberá a este trabalho conseguir, dentro do possível, averiguar a localização destas fábricas. Outro documento, não publicado, é o trabalho “Ordenamento do Bairro Operário”, que se refere ao Bairro de Casas Para Famílias Pobres da cidade que ficou conhecido como “Bairro Operário”, sendo esta a única fonte documental do Município sobre o mesmo, deixando espaço para a contribuição deste trabalho, a fim de obter um maior conhecimento sobre este conjunto habitacional.
0.5.2 Portimão
O livro “Portimão”, de Maria Ventura e Maria Marques (1993), faz um enquadramento histórico da cidade, da sua fundação ao século XX, ilustrado por algumas plantas que nos permitem entender a evolução da estrutura urbana. São ainda importantes as descrições económicas da região, com relevantes menções ao movimento portuário da cidade e as ligações entre a cidade, o porto e as zonas rurais. Outra publicação relevante é “Portimão: Industriais conserveiros na 1.ª metade do Século XX”, de Maria João Duarte, que faz uma identificação dos industriais da cidade, as suas fábricas e os locais de laboração, mas, para além disso, faz uma contextualização do surgimento e evolução da industrial local e elabora em que contexto é que alguns destes industriais foram importantes para a história da cidade.
Destacam-se, ainda, dois temas importantes: a construção do Bairro Operário, iniciado por Caetano Feu ao lançar a construição de um bairro para os seus operários e a localização das fábricas, para a qual o livro contribui com uma lista de proprietários, nome das empresas e localização das fábricas.
Esta recolha de informação sobre a localização dos edifícios fabris resume-se num mapa da cidade, onde estão identificados os locais das fábricas de conserva. O Museu de Portimão elaborou, também, um mapa com a localização das fábricas de conserva, mas para ambas as margens do Rio Arade, onde a informação vai ao encontro do que está publicado no livro de Maria Duarte (2003). No espólio do Museu de Portimão existe, também, uma importante recolha documental, entrevistas realizadas a antigos operários da indústria conserveira e, ainda, um trabalho não publicado, como o título “Bairros com História e Estórias de Trabalho: a história e memória da classe trabalhadora portimonense”. Este trabalho, elaborado em c. 2004, reúne informação sobre o Bairro Operário (1934-1936), o Bairro Pontal (1941-1951) e o Bairro dos Pescadores (1948-1951), referindo a motivação do seu surgimento, dentro do contexto local, bem como os promotores das diferentes iniciativas habitacionais, as datas de aprovação, construção e inauguração de cada um destes conjuntos, e ainda outras informações como os valores das rendas, transações para compra de terrenos, informações sobre os moradores, alterações ou expansões ao conjunto edificado. Existe ainda um dossier, que se pode considerar como um anexo a este trabalho que contém entradas de jornais locais, relatórios camarários e testemunhos locais, sobre os vários bairros que foram utilizados como suporte.
Ainda, no que diz respeito ao Bairro Operário, o trabalho académico “O Bairro Operário de Portimão: História e património” de Fernando Ramos, é um trabalho mais completo sobre este bairro específico, que além da contextualização do mesmo, detalha a sua localização, tipologias e outros elementos arquitetónicos através de elementos gráficos, realizado uma proposta para a preservação do conjunto arquitetónico e de um percursos onde seria possível conhecer o bairro e cada uma das suas tipologias.
0.5.3 Olhão
Para o estudo evolutivo da cidade de Olhão, foi consultado o trabalho académico “Evolução Urbana de Olhão”, de Sandra Romba, que relata a origem daquele aglomerado urbano, quais os bairros fundadores, os processos de expansão e ocupação das zonas envolventes até aos séc. XIX. A análise deste trabalho permite o estudo da malha urbana, a evolução da linha de costa com a ria, assim como do surgimento dos primeiros armazéns na zona ribeirinha, onde se edifica a primeira fábrica de conservas em Olhão. A “Monografia do Concelho de Olhão”, de Ataíde Oliveira, e o livro “História Breve da Vila de Olhão da Restauração”, de Antero Nobre, serviram de complemento histórico à análise urbana da cidade.
Estes documentos abordam a capacidade piscatória e de navegação dos habitantes locais, assim como da indústria de conservas, bem como o seu surgimento.
No que diz respeito às fábricas de conservas e sua localização, existe “apenas” a publicação “Ainda Olhão e a Indústria de conservas de Peixe” de Luciano Cativo, um testemunho de um ex-operário conserveiro e habitante de Olhão, que através do seu conhecimento e de uma recolha de outros testemunhos orais, realizou uma tentativa de localizar as fábricas, as empresas e os seus proprietários. O documento não faz qualquer referência documental e não apresenta qualquer elemento gráfico da localização dos edifícios, o que torna difícil, por vezes, a localização das fábricas, dado que a referência ao local onde estas laboravam é por vezes, feita através do nome de outro serviço ou empresa que ocupava aquele local na época em que o documento foi produzido. No entanto, trata-se da única publicação que faz por localizar as dezenas de fábricas que se instalaram na cidade e, neste sentido, pretende este trabalho contribuir com alguma clareza e elementos gráficos que permitam facilitar a localização destes edifícios.
Para o estudo das iniciativas de habitação em Olhão, é importante referir o artigo “Lisboa em Olhão/ Olhão em Lisboa: História e fábula em três bairros de habitação económica, desde 1925” de Ricardo Agarez, na Revista Monumentos nº33. O artigo relata o surgimento e contexto do Bairro Lucas & Ventura (1925), o Bairro Municipal (c.1930), que não foi construído e o Bairro de Pescadores (1945). Focando-se nos traços regionais e locais que foram assumidos nos diversos bairros, os promotores destes aglomerados habitacionais, as tipologias e dos arquitetos escolhidos para desenhar estes projetos a partir de Lisboa. E para o estudo do Bairro Operário (1935) foi consultado a publicação “Algarve Building: Modernism, Regionalism And Architecture In The South Of Portugal, 1925-1965” do mesmo autor.
0.5.4 V.R.S.A.
No que respeita a Vila Real de Santo António, a obra “Vila Real de Santo António: Urbanismo e Poder na Política Pombalina”, de José Eduardo Horta Correia, faz um relato detalhado sobre a história do surgimento desta cidade, de traçado pombalino. Através do texto e da documentação presente no livro, podemos acompanhar evolução urbana, compreender os motivos do seu surgimento, a sua ligação com o território envolvente e a Monte Gordo, assim como as suas dinâmicas comerciais e portuárias sempre ligadas à pesca e, posteriormente, à indústria conserveira. Para complemento desta cronologia evolutiva e, principalmente, para compreender a ocupação daquele território numa fase anterior, a publicação “Os 500 anos da Fundação de Arenilha: memórias de uma «vileta» nascida no decurso da Expansão Portuguesa”, de Fernando Pessanha, faz uma análise sobre a ocupação daquele território e da povoação que ali existiu – Arenilha – até ao seu desaparecimento, antes de se construir Vila Real de Santo António, com o traçado pombalino que hoje se conhece.
Existe uma outra publicação, “Vila Real de Santo António e o Urbanismo Iluminista”, da Câmara Municipal, sob a coordenação de António Rosa Mendes, que faz um resumo histórico da cidade de Vila Real de Santo António, analisando o contexto histórico anterior à intervenção pombalina, fazendo uma análise urbana e à arquitetura dos quarteirões regulares e ao simbolismo dos vários elementos. Segue-se uma análise económica e social sobre o Rio Guadiana, que inclui textos sobre a Companhia das Reais Pescarias do Reino do Algarve, sobre a relação da cidade com a Mina de S. Domingos e sobre a importância da indústria conserveira e as suas primeiras fábricas. A publicação é rica em documentos e fotografias que auxiliam na compreensão e representação dos temas abordados, embora exista espaço para aprofundar os temas, por se tratar de um trabalho generalista, focado nos aspetos históricos e mais relevantes da cidade. No que diz respeito à indústria conserveira e à análise urbana, existe espaço para um contributo mais profundo e mais gráfico pois, mais uma vez, não existe um elemento resumo ou um texto que tente localizar as fábricas conserveiras.
Sobre o tema da habitação operária ou da população mais pobre, não foi possível identificar qualquer publicação sobre o tema.
Ainda sobre V.R.S.A., a revista Monumentos, no seu número 30, reúne vários artigos sobre a cidade. Os temas abordados são bastante específicos, permitindo uma maior profundidade na exposição da informação, conferindo-lhe um enorme interesse para este estudo.
Os artigos “Da «casa portuguesa» ao «Português Suave»: ou algumas variações sobre o tema dos telhados pombalinos”, por José Manuel Fernandes, faz referência a um plano da Junta Autónoma dos Portos do Sotavento do Algarve, bastante importante para a contextualização evolutiva da malha urbana e das transformações das estruturas e equipamentos portuários; “A indústria conserveira vila-realense: um caso peculiar de urbanização industrial e de património” por Jorge Custódio, que além da documentação relevante que apresenta sobre as fábricas da cidade, enumera diversas empresas enquanto realiza a contextualização histórica dos altos e baixos da indústria na cidade, desde o seu surgimento até ao seu término, defendendo a necessidade de preservar a identidade conserveira e piscatória local como parte do património da cidade; a relevância do artigo de João Paulo Martins “O edifício de passageiros da estação ferroviária de Vila Real de Santo António: Cottinelli Telmo e os novos edifícios públicos” vai para além da análise histórica e arquitetónica da estação desenhada por Cottineli Telmo, fazendo um retrato histórico dos avanços e recuos que existiram do desenho à construção da linha de caminho de ferro definitiva na cidade. Auxiliam ainda na compreensão dos vários projetos, para a linha de caminho de ferro, estação permanente e provisória, assim como a ligação fluvial com o caminho de ferro que existiu naquela localidade; “O território e os transportes em Vila Real de Santo António: Notas acerca das infra-estruturas de transporte no século XX” por Gilberto Gomes, faz um retrato, com foco na primeira metade do séc. XX, das estruturas marítimas e fluviais, sistema ferroviário e rodoviário, analisando os problemas que foram sendo assinalados e os projetos que os vieram solucionar, contribuindo para o progresso e transformação da vida social e económica, assim como para a transformação urbana da cidade.
Em termos gerais, a falta de documentação preservada ou de publicações bem estruturadas, com fontes e bibliografia adequada sobre este período temporal, reforça a relevância do contributo deste trabalho para o conhecimento das transformações e as suas ligações com a indústria conserveira no início do século XX. Ainda que, em alguns dos casos, ou dos temas, exista mais informação ou informação de maior qualidade, o maior vazio para este período continua a residir na análise urbana, onde está o foco principal deste trabalho. A falta de investigação na área da arqueologia industrial sobre a indústria conserveira no Algarve, principalmente no que respeita a localização e identificação destes edifícios na malha urbana das cidades, levou à consulta de diversos arquivos, como explicado na metodologia. Ainda que a identificação destes edifícios não seja o nosso foco, este trabalho também contribuirá para esse conhecimento, pois seria impossível proceder-se à análise urbana sem ter esse conhecimento prévio. Outro tema onde existe ainda espaço para investigar é o da habitação.
Embora existam várias publicações, e muitas delas recentes, que abordam o tema a nível nacional ou até regional e local, continua a existir espaço para se aprofundar o conhecimento sobre a habitação operária no Algarve, das iniciativas dos industriais que construiram para os seus trabalhadores, das iniciativas estatais e a sua contextualização local e das condições em que viveram todos os outros, em habitações mais ou menos condignas dentro ou fora dos centros urbanos. Devido a falta de conhecimento publicado sobre estes temas pretende este trabalho ser um contributo sobre os mesmos e ainda outros que se interligam com os temas abordados.
0.6 Metodologia
Uma primeira consulta bibliográfica sobre o período em estudo e a indústria de conservas, foram indispensáveis para determinar as cidades a estudar. Para o estudo destes núcleos urbanos foi feita uma recolha de elementos gráficos (plantas, mapas, fotografias aéreas, planos, projetos), que permitissem compreender a evolução urbana e as suas alterações ao longo do tempo. Para conseguir esses elementos, os mesmos foram requisitados às Câmaras Municipais, visitados em Arquivos Municipais e Museus dos respetivos locais em estudo. Foi, ainda, visitado o Arquivo Distrital de Faro, para recolher informação que permitisse localizar os edifícios da indústria em estudo; a Universidade do Algarve e CCDR Algarve, para a recolha da documentação relativa aos Anteplanos de Urbanização e outra documentação relevante no fundo da D.G.S.U.
Houve necessidade de redesenhar alguns elementos, dada a impossibilidade de realizar uma reprodução legível para uso neste trabalho, com os meios disponiveis nos arquivos.
O exemplo mais evidente desta situação será o levantamento da cidade de Lagos, que data de 1924, efetuado pelo exército, sob comando do Capitão Raul Frederico Rato. Este trata-se de um documento em tecido, de grandes dimensões (2.18m x 1.39m), para o qual não existe uma reprodução integral que não estivesse modificada. Por essa razão, utilizando a esquadria de coordenadas presente no documento, foram fotografados todos os quadrantes, agregados através de um programa de edição de imagem e, posteriormente, reproduzido, desenhando, digitalmente, por cima da imagem.
A falta de estudos fidedignos sobre a localização da maioria das fábricas potenciou um trabalho conjunto, de recolha e partilha de informação, com os arquivos de Olhão e Vila Real de Santo António, assim como com a fototeca de Lagos, para determinar, com o máximo de certeza possível, a localização destes equipamentos industriais. Esta localização teve por base, sobretudo, a 5º Circunscrição Industrial, que consiste num conjunto de documentos de vistorias para atribuição de alvará a indústrias classificadas como insalubres, incómodas, perigosas ou tóxicas. Esta documentação consultada no Arquivo Distrital de Faro, dispõe de várias pastas por empresa, com informações como nome, proprietário, localização, início e fim do processo, bem como plantas em alguns dos casos. Infelizmente, parte da documentação deste fundo desapareceu, e por essa razão o arquivo é bastante incompleto. A informação deste fundo, de outros arquivos municipais e museológicos, a memória e conhecimentos transmitidos por via oral, de alguns populares que estiveram relacionados com a indústria, serviram para localizar geograficamente a maioria das fábricas que existiram no período estudado. A análise da indústria conserveira passará por localizar os edifícios fabris em cada localidade, determinar quando surge o primeiro edifício industrial de conservas em cada sítio e a evolução na ocupação da malha urbana pelos mesmos, ao longo do tempo; estudar as correlações, urbanas e arquitetónicas, entre a indústria em estudo e a evolução/expansão da malha urbana; compreender a relação com as indústrias adjacente e matérias-primas (tipografia, vazio e folha-de-flandres, sal e azeite) e o surgimento de bairros, habitações operárias e as suas condições de habitabilidade. Ao longo do trabalho, devido à análise urbana e ao aprofundar do conhecimento do tema, foram feitas recolhas de elementos específicos de projetos ou planos urbanos, para melhor compreensão do objeto de estudo. Para esta análise foram consultados o Arquivo Distrital de Faro, o Arquivo Municipal de Olhão, o Centro de Documentação e Arquivo Histórico do Museu de Portimão, o Arquivo Histórico e Municipal de Vila Real de Santo António, Câmara Municipal de Lagos, o Arquivo Central de Gambelas – Universidade do Algarve, Biblioteca Nacional de Portugal, Centro Português de Fotografia, Instituto Hidrográfico Português, o Arquivo do Forte de Sacavém – S.I.P.A., o arquivo da CCDR Algarve e o Arquivo Histórico do Ministério das Obras Públicas sob tutela do Ministério da Economia.
A Indústria Conserveira na Construção da Malha Urbana no Algarve: CONSIDERAÇÕES FINAIS e BIBLIOGRAFIA
A Indústria Conserveira na Construção da Malha Urbana no Algarve: PORTIMÃO (8)
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A Indústria Conserveira na Construção da Malha Urbana no Algarve: INTRODUÇÃO (2)
2020 – A Indústria Conserveira na Construção da Malha Urbana no Algarve: Das Estruturas Produtivas à Habitação Operária (1900-1960) – Armando Amaro
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