Francisco Rodrigues Tenório

SOURCES:

Monografia do Concelho de Vila Real de Santo António, de Francisco X. d`Athaide Oliveira, 1908

História cronológica da vida de Francisco Rodrigues Tenório – Textos retirados do livro Memórias & Documentos volume III, de António Horta Correia – Memórias & Documentos volume III

Fotografia no livro Monografia do Concelho de Vila Real de Santo António, de Francisco X. d`Athaide Oliveira, 1908

Algumas Palavras

Francisco Rodrigues Tenório, o honrado industrial, a cuja memória é consagrado o presente livro, nasceu em Villa Nueva de los Castilejos (província de Huelva) -(Andaluzia) – Hespanha.
De muito criança iniciou a sua carreira como marçano no estabelecimento commercial de Manuel Mourão; em Loulé, e poucos annos depois entrou como caixeiro na importante casa commercial de Sebastião Rodrigues Centeno, de Villa Real de Santo António.
Tantas provas deu da sua capacidade e do seu tino pratico – affirmou, em 1897, o importante jornal Commercio e Industria, de Lisboa – que, decorridos poucos annos, estabeleceu-se de sociedade com Joaquim Affonso, ficando pelo falecimento do seu sócio, com o activo e passivo da mesma firma commercial.
Foi este o ponto de partida para a sua expansão industrial, e, diga-se a verdade, ninguém como elle correspondeu as esperanças no seu noviciado, na frase do citado periódico.
Tão importante e tão extenso foi o desenvolvimento que soube imprimir à sua casa que, em pouco tempo, era considerada uma das principaes da florescente villa.
A este tempo obteve a agenda de quasi todos os bancos do paiz, o que e uma nota simptomatica da sua honra e do seu crédito. No entanto, já por esta época, teve o embate de difficuldades imprevistas e não presumíveis, as quaes fez frente com toda a sua tenacidade, vendo-se ainda assim obrigado a restringir as suas transações.
Intelligente e ousado, com a fé que transporta montanhas e com a tenacidade de um infatigável trabalhador, mediu alturas, contemplou a pé firme o seu futuro e depois de um plano intelligentemente concebido e maduramente estudado, resolveu-se a montar uma fábrica de preparo de atum, e essa fábrica, dentro de pouco tempo, abrigava em si um grande pessoal, sendo os seus productos os melhores cotados nos mercados do estrangeiro e no próprio paiz.
Francisco Rodrigues Tenório não conseguira, porém, somente afamar os productos da sua fábrica, teve a felicidade de captar, pelo seu génio franco e bondoso, o amor e respeito de todos os seus operários, que o adoravam.
Mantivemos com o honrado industrial estreitas relações de amizade desde o tempo em que passávamos as épocas balneares em casa do reverendo pároco, António Máximo de Souza Callado, nosso parente, então parocho de Villa Real e actualmente de São Bartholomeu de Messines; e essas relações intimas as mantivemos sempre, não obstante encontrarmo-nos raríssimas vezes, pois que as, nossas obrigações officiaes não nos permittiam a ausência da nossa comarca, nem as suas ocupações lhe permittiam afastar-se da sua fábrica.
Em 8 de fevereiro do anno passado fomos informado de que Tenório se achava em Loulé, vindo a esta villa passar alguns dias na companhia de seu irmão querido, o nosso amigo José Rodrigues Tenório. Quem nos communicou a noticia acrescentou que o honrado industrial padecia de uma lesão muito adiantada. Fomos immediatamente visitá-lo. A notícia era verdadeira, e a sua presença ter-nos-ia arrancado lágrimas, se não estivéssemos prevenido. Tenório, ao avistar-nos, naquele seu modo de dizer, singelo e simples, declarou-nos que se andava a despedir dos parentes e amigos …
E não se enganara: o trabalhador infatigável, o amigo sincero e honrado, caiu fulminado pela lesão em 14 de maio do mesmo anno, deixando dois filhos, o sr. capitão Francisco Faria Tenório, havido de sua primeira esposa D. Dolores Faria, o estudante do liceu, Francisco da Rocha Tenório, de sua segunda esposa D. Maria da Rocha Tenório, e viúva a sua terceira esposa D. Rita da Rocha Tenório, da qual lhe não ficou descendência!

***

Villa Real de Santo António, sem distinção de partidos nem de classes, curvou-se commovida e respeitosa em frente das cinzas do seu querido amigo, e acompanhou-as em imponente prestito até ao cemitério, sendo os operários e os pobres os que deram a nota mais sentida e angustiosa em pranto commovente pela perda do seu patrão, do seu pai e do seu querido protector!
Naquella expansão de lágrimas e de lamentos, que dos operários e dos pobres se communicavam as primeiras classes sociaes, viu-se bem quanto o extinto Tenório era adorado.
A esta consagração de uma villa inteira, a que não faltaram muitos amigos das freguesias próximas e ainda, das povoações andaluzas, faltamos nós, não por negligência, mas por absoluta impossibilidade.
São passados mezes, e hoje desejamos oferecer a  memória do nosso chorado amigo a Monografia de Villa Real, que elle tanto amou; e porque desejamos igualmente offerecer a honrada e industrial villa um documento do nosso sincero reconhecimento pela maneira excepcional como provou a sua consideração e respeito junto da urna onde se encerravam os restos mortaes do extinto industrial, aqui declaramos que o producto liquido da venda da presente Monografia será aplicado ao hospital da mesma villa, instituído em 1882, mas que, por motivos ponderosos, ainda hoje não pode abrir as suas portas aos pobres e miseráveis.
Cremos assim tornar mais agradável a memória do pai dos pobres a nossa Monografia, pois que, sendo realmente Tenório o pai de todos os pobres, que lhe imploravam obulos e proteções, satisfeito ficara de que alguém, seu amigo, desejou em parte suprir a sua falta junto dos infelizes, por sua intenção.

***

Na confeção do presente livro consultamos a nossa historia e fizemos as devidas investigações, valendo-nos o auxilio de illustres amigos, entre os quaes especializaremos o nosso primo e amigo, o ex.mo sr. António de Magalhaes Barros, de Lisboa, que relevantes serviços nos tem prestado em todos os nossos trabalhos d’este genero, dando-se ao cuidado de procurar na Torre do Tombo ilucidativos documentos. Aqui agradecemos tao valiosos serviços e, pedimos desculpa de tanto o importunar.

***
Aos reverendos Jorge da Circuncisao Leiria, pároco de Villa Real de Santo António, e Andre Lopes Terremoto, pároco de Cacella; aos dignos chefes das diversas Repartições do concelho; e aos nossos amigos, indicados no percurso deste livro, um caloroso aperto de mão pela solicitude com que nos auxiliaram, fornecendo-nos noticiase informações curiosas, estatísticas e documentos valiosos, que muito recomendam a presente Monografia.

A todos nos confessamos profundamente agradecido.

Loulé, 1 de Janeiro de 1908.

Francisco Xavier d’ Athaide Oliveira.

Scroll to Top