LITORAL: REVISTA MENSAL DE CULTURA  (Lisboa, 1944-1945)

Disponível na Hemeroteca Digital, em: http://hemerotecadigital.cm-lisboa.pt/Periodicos/litoral/litoral.htm

A “POSIÇÃO, e «não programa», é a palavra que intencionalmente se inscreve no pórtico desta revista. Posição, como modo de ser e estar presente no âmbito imensurável da actividade espiritual.” Elitista e ilustrada, a revista “consubstancia-se na «expressão coletiva» da autenticidade cultural dos seus valores mais selectos, dos seus elementos de escol”, e apresenta-se como um “empreendimento de iniciativa e de recursos exclusivamente particulares”.

Apareceu em Junho de 1944, alheia a uma Europa que festejava o fim anunciado do segundo conflito mundial, porque era tempo de tomar “posição perante o sistemático influxo de várias correntes ideológicas e doutrinárias difundidas entre nós, nos últimos anos, por todos os meios publicitários, quer em línguas estrangeiras, quer na nossa” – segundo os seus responsáveis, que alertavam para “uma despersonalização colectiva” (1)

Foi dirigida por Carlos Queiroz (2), reconhecido poeta presencista, e teve “orientação gráfica de Bernardo Marques (3), artista multifacetado e modernista.

1 Cf. Artigo “Posição”, n.º 1 (p. 5, p. 6, p. 9).

2 José Carlos Queiroz Nunes Ribeiro (1907-1949), foi poeta, crítico, ensaísta, e publicista português. Nasceu em Lisboa, mas frequentou a Faculdade de Direito em Coimbra. Conviveu com poetas do Orpheu: jornal de arte (Porto, 1926-1933), e pertenceu à geração presencista; considera-se que foi o mediador literário entre essas gerações, as quais influenciaram o seu estilo poético, caracterizado como um compromisso clássico-moderno. Com o seu primeiro livro de teor romântico, Desaparecido (1935), recebeu o Prémio Anthero de Quental do Secretariado de Propaganda Nacional (SPN). Publicou, entre outros livros, Homenagem a Fernando Pessoa (1936) de quem foi amigo, e Breve Tratado de Não-Versificação (1948). Foi, também, funcionário da Emissora Nacional, onde divulgou poesia, literatura, teatro e um Portugal turístico. Dispersou poemas por vários periódicos, especialmente na Presença: folha de arte e crítica (Coimbra, 1927-1977). Dirigiu e fundou várias revistas, e colaborou na Variante (Lisboa, 1942-43), uma revista dos anos 40, como esta, Litoral, onde também colaborou, assinando Carlos Queiroz, C. Q., Fernão de Lisboa, e F. de L. (V. nossa nota 28).

3 Bernardo Loureiro Marques (1898-1962) foi um artista (desenho, ilustração, caricatura) e pintor português. Nasceu em Silves, cursou o liceu em Faro, e frequentou a Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (FLUL) durante três anos (1818-1921). Expôs, pela primeira vez, na III Exposição do Grupo dos Humoristas Portugueses (e Espanhóis) no Salão do Teatro de São Carlos (1920). Entre 1923 a 1940, viveu na Calçada dos Caetanos, em Lisboa, com a mulher, Ofélia Marques (V. nossa nota 22, p. 8). Em 1924, recebe a primeira encomenda de um quadro para o café A Brasileira (Chiado). Depois, pinta os painéis do Círculo Eça de Queiroz, em Lisboa. Vai a Berlim, onde contacta com o expressionismo alemão, e adapta-o ao contexto lisboeta – I Salão dos Independentes, e II Exposição de Arte da Caixa do Sindicato dos Profissionais da Imprensa de Lisboa (1930). Em 1931, expõe no II Salão dos Independentes, e decora o Pavilhão Português da Exposição Colonial Internacional de Vincennes, em França. A seguir executa decorações para o Cortejo Fluvial das Festas de Lisboa; e expõe no Salão de Inverno (1932-1933). Volta a Paris, expõe na Casa de Portugal, e decora o pavilhão português da Exposição Internacional (1937). Decora, também, os pavilhões de Nova Iorque, e de São Francisco (1939), e o Pavilhão Português da Exposição do Mundo Português (1940) em Lisboa. Foi, também, artista gráfico em publicidade, capas de livros, cartazes, cenários para filmes, e figurinos para bailado. E foi diretor artístico e colaborador em várias revistas, como a que agora apresentamos (V. Índice I, p. IX, para os n.ºs 1-4). Como artista modernista português, trabalhou para a política do espírito de António Ferro, seu vizinho na Calçada dos Caetanos. “A colaboração que como desenhador deixou em periódicos, merece uma referência especial pelo seu fino e por vezes amargo humorismo” (V. “MARQUES, Bernardo” – In Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, V. 16, Lx.-Rio de Janeiro: Ed. Enciclopédia, 1978, p. 392- 393).

Editada por Mário Silva, a revista manteve “redacção e administração na Rua das Flores, 81, 2.º D, com o telefone 23343”, em Lisboa. Foi composta e impressa na tipografia Ramos, Afonso & Moita, sita na Rua d’A Voz do Operário, 8-12, com o telefone 23866 de Lisboa, que publicou anúncio de meia página, a partir do n.º 2 da revista. Foi ilustrada com a chancela da Neogravura (Travessa da Oliveira à Estrela, 4-10, Lisboa) e de A Ilustradora; a sua qualidade gráfica, acrescentamos nós, foi exponenciada pela fotografia profissional de Mário Novais (4).

A sua coleção completa é constituída por seis números, cada um com mais de cem páginas numeradas: o nº 1 (Junho 1944) totaliza 104; o nº 2 (Julho 1944), 116; o nº 3 (Agosto-Setembro 1944), 130; o nº 4 (Outubro-Novembro 1944), 124; o nº 5 (Dezembro 1944), 116; e o nº 6 (Janeiro-Fevereiro 1945), 128. Com periodicidade mensal anunciada no seu subtítulo, a revista sofreu atrasos, não só no último número, bimestral, mas também no terceiro, no qual aumenta páginas e anuncia previamente que a venda “ao preço normal de 10 Escudos – é uma vantagem que LITORAL tem o gosto de conceder aos seus Assinantes e Compradores”, e que será publicado na segunda quinzena do mês de Setembro.”(5) O mesmo aconteceu com o n.º 4, que merece a seguinte nota da redação: “Circunstâncias de vária natureza, a que não foi estranha a anormalidade dos tempos presentes, motivaram um atraso excessivo na saída do número 3 de LITORAL, forçando-nos a fazer corresponder o presente fascículo aos meses de Outubro e Novembro”, que “completa o nosso 1.º Volume.” (6)

4 Mário Novais (1899-1967) foi um fotógrafo e empresário português; nasceu e cresceu rodeado de fotografias. Filho do fotógrafo retratista Júlio Novais (1867-1925), sobrinho do António Novais (1855-1940), e irmão de Horácio Novais (1910-1988), que consta como colaborador aqui (n.º 3). A sua carreira profissional começou na década de 20 (século XX), na Fotografia Vasquez, mas especializou-se em fotografia de obras de arte e arquitetura; realizou, também, foto-reportagens, e fotografia publicitária, comercial e industrial. Empreendedor, teve o seu Estúdio Novaes (1933-1983?), na Avenida da Liberdade, 115, em Lisboa. Fotógrafo do seu tempo, Mário Novais trabalhou para organismos do estado como o SPN, e foi o responsável pela cobertura fotográfica de eventos em Portugal, como a Exposição do Mundo Português (1940), e no estrangeiro. Colaborou em vários periódicos, assim como o seu irmão, nomeadamente na Variante, Mundo Literário (Lisboa, 1946-48) e na Mocidade Portuguesa Feminina: boletim mensal (Lisboa, 1939-47) , (disponíveis na Hemeroteca Digital)

O espólio do Estudio Novaes foi adquirido pela Fundação Calouste Gulbenkian, em 1985. Consulte a sua extensa colaboração no Índice I (p. XI, para os n.ºs 1-4).

5 Cf. “Aos Senhores Assinantes”, n.º 2 (p. [220]).

6 Cf. Nota da redacção “Litoral”, n.º 4 (p. [476]).

A “anormalidade dos tempos presentes” é uma referência à Segunda Guerra Mundial, como causa da falta de papel de impressão, e da carestia associada ao racionamento e à distribuição, num Portugal neutral, em relação à Europa ainda em guerra. Num país geograficamente encurralado entre a Espanha, também ela destruída por uma sangrenta guerra civil, e o oceano Atlântico e mar Mediterrâneo, palcos de batalhas navais. A par da difícil vivência humana, com senhas de racionamento, acrescente-se a dificuldade financeira para publicar uma revista independente, mesmo com receita publicitária. A partir do quarto número, a revista passa a “Propriedade da Emprêsa Editora Litoral” (7).

Para ser visível, a nova empresa publica anúncio próprio, de página inteira, pois tem “em estudo um plano de edições de obras de autores portugueses e brasileiros”; e outro, de meia página, para divulgar que “LITORAL vai distribuir uma circular, convidando escritores portugueses e estrangeiros a colaborar no número extraordinário consagrado ao LIRISMO” (n.º 5). Já antes, sobre estes projetos, a revista anunciava “Números Especiais” (n.º 1, p. 27); os quais passaram a dossiers, referidos por Daniel Pires na sua ficha bibliográfica da revista: “o n.º 2 (p. 218) anunciava para breve – projecto nunca concretizado – dossiers especiais sobre vultos nacionais e brasileiros: Eça, Raúl Brandão, Leonardo Coimbra, Teixeira de Pascoaes, Fernando Pessoa, Gilberto Freyre, Manuel Bandeira, entre outros.” (8) Uma última tentativa de sobrevivência, sempre com a intenção de captar novos assinantes, surge no último número da revista que fecha, com mais outro projecto não concretizado, num anúncio  solto: “O próximo fascículo da revista LITORAL será um número extraordinário dedicado ao Século Dezanove em Portugal incluindo alguns estudos sobre Eça de Queiroz (n.º 6).

CONTEXTOS, PUBLICO-ALVO, POSIÇÃO E OPOSIÇÃO

O seu contexto histórico é referido de forma sui generis, no abrangente artigo de abertura, não assinado, intitulado “Posição”: “A posição portuguesa perante o Mundo, se por um lado nos força, geograficamente e historicamente, a uma tensão constante de tendências múltiplas e tantas vezes antagónicas, susceptíveis de conduzir-nos a uma estéril dispersão ideológica e passional, proporciona-nos, por outro, uma resistência de estrutura nuclear, porventura latente, mas incorrupta.” Mais à frente, no mesmo artigo, diz-se que “carece o Português, para tornar mais reconhecível ao Mundo – como a seus próprios olhos – a natureza possivelmente diferenciada e, sem dúvida, criadora, dessa complexidade estrutural: – uma consciência culturalmente esclarecida”. Segue-se a sua orientação ou posição: “Aderindo ao renascimento dos estudos mitológicos, investigará nesse mundo, tão fértil de ensinamentos e sugestões, as possíveis fontes ou indícios esclarecedores de certas correntes e obras mais significantes da nossa poética; estará atento aos novos aspectos da apologética religiosa, exigidos pela angústia em que se debate o homem contemporâneo; abrir-se-á para a especulação filosófica, estimulando as iniciativas que superem o nível escolar, e que dêem ao pensamento português a expressão da sua maturidade; sondará na actividade estética a razão de ser e os caracteres definidores das suas diversas expressões plásticas e rítmicas (…); fará por encaminhar a curiosidade dos jovens estudiosos para um aprofundamento sistemático e interpretativo das pesquisas etnológicas e folclóricas em grande escala praticadas pelas gerações anteriores; dará, finalmente, acolhimento e expansão a produções ficcionistas de Autores portugueses e brasileiros, sem atender a preconceitos de geração ou de escola, mas desde que revelem vocação autêntica (…). A intervenção crítica de LITORAL cingir-se-á às realizações objectivas (livros, publicações periódicas, espectáculos, exposições, conferências) que possam influir, de modo positivo ou negativo, na fisionomia cultural da nação, obstando a que impunemente se desfigure ou se obscureça a sua verdadeira imagem. Aqui, ironiza-se, também, a intemporal “luta herói-cómica para conquista das «ordens honoríficas» (…) e que se esconde, na multiplicidade das suas formas, aos olhos desatentos da maioria do público, serão focados à luz clarificante de LITORAL.” E, claramente, a revista queria “contribuir para a formação de uma «consciência cultural» de surto português.” (9)

No fim do seu primeiro número, encontram-se outros esclarecimentos: “LITORAL só publica textos inéditos e em língua portuguesa”; e “só inclue, por princípio, colaboração solicitada. No entanto – aberta, como quere estar, para as autênticas vocações, e, em especial, da juventude – aceitará quaisquer trabalhos, em prosa ou em verso, enviados espontaneamente pelos Autores, desde que estejam conformes com o carácter de isenção e o critério selectivo esclarecidos no artigo de abertura.” (10)

Num mundo dividido por ideologias, não admira que no último número a redação da revista publicasse o texto “Posição e Oposição”, não assinado, não a anunciar o fim da revista, mas profetizando-o. De teor humanista, constata que a política “absorve uma boa parte da imprensa periódica” mas que, “se o homem no dizer do Filósofo, é um animal político, não significa a asserção que êle é só animal político (…). Defina-se, pois, claramente, o sentido da nossa oposição: Não somente nos repugna a política desligada do espiritual, mas também a política que, nos seus processos extremistas, se afasta do concreto e individualizado amor pelo semelhante (…); a que, em suma, re-nega o respeito pelos viventes, contrariando criminosamente a tradicional brandura dos nossos costumes, cuja expressão mais alta foi, neste domínio, a admirável – e esperamos que irrevogável – abolição da pena de morte.” (11)

De notar que, em Lisboa, nos anos 40 do século XX, apareceram outras revistas contra a corrente neo-realista e com duração efémera, como a Variante (1942-43) de arte, que se vendia a 25$00, mais do dobro desta, Litoral (1944-45), de cultura, a 10$00. Estas revistas teorizantes recusavam-se, ainda, a publicar polémicas, ou matérias políticas de facto. Assim, por não contrariarem a política do seu tempo, não eram sujeitas à censura prévia dos periódicos no tempo do Estado Novo (1933-1974), e não incluíam o vexante dístico: visado pela comissão de censura.

7 Cf. Ficha técnica do n.º 4 (p. [355]).

8 V. “Litoral” – In Dicionário da Imprensa Periódica Literária Portuguesa do Século XX (1941-1974) / Daniel Pires, Vol. II, 1º tomo. Lisboa: Grifo-Editores e Livreiros, 2000 (p. 295).

9Cf. Artigo “Posição”, n.º 1 (p. 5-7).

10Cf. Nota da redacção “Litoral”, n.º 1 (p. [104]).

11Cf. Artigo “Posição e Oposição”, n.º 6 (p.234-236).

ESTRUTURA GRÁFICA

A sua coleção completa é constituída por dois volumes, com numeração seguida em cada um. O primeiro volume foi constituído por 4 números ou fascículos, terminologia usada indiferenciadamente na revista, e totalizou 476 páginas. O segundo volume, porque a revista terminou, ficou com dois números, o 5 e o 6, culminando na página 244, mas sem índice.

Impressa em formato pequeno, de cerca de 20 cm, a revista vendia-se com capas e contracapas cartonadas; e incluiu um “Índice do Volume I: fascículos 1-4, em extratexto, de 14 páginas com numeração romana, distribuído com o “5.º fascículo (…) bem como uma fôlha de guarda e um ante-rosto destinados a precederem, na encadernação, o frontispício do fascículo N.º 1.”12

Os únicos elementos coloridos da revista são as capas cartonadas em azul marinho, com o título a preto em letra maiúscula e cheia, seguido do subtítulo em letra cursiva e da ilustração, a branco, de um pássaro a transportar no bico a frágil letra L (Litoral ou Liberdade?) a preto; segue-se a data de cada exemplar. A numeração individualizada e a ficha técnica geral vêm nas capas interiores; outra folha contém os nomes dos colaboradores em cada número.

No início dos seus números, exceto no primeiro, encontram-se citações de ilustres pensadores portugueses já falecidos: Fernando Pessoa (n.º 2, p. 106); J. P. Oliveira Martins (n.º 3, p. 222); João Pedro do Vale (n.º 4, p. 354), Teófilo Braga (n.º 5, p. 2), e Luciano Cordeiro (n.º 6, p. 118). E, antes dos textos de abertura, surgem trabalhos de populares artistas portugueses e brasileiros contemporâneos: Mário Eloy (1900-1951), (n.º 1); Francisco Franco (1885- 1955), (n.º 2); Cícero Dias (1907-2003), com “Litografia para a edição especial de A Ilha dos Amores de Camões. Lisboa, 1944” (n.º 3); Maria Keil do Amaral (1914-2012), (n.º 4); Dórdio Gomes (1890-1976), (n.º 5); e Di Cavalcanti (1897- 1976), (n.º 6).

A maioria das folhas de cada número encontra-se impressa em texto corrido com letterings diferentes a preto. No entanto, cerca de vinte folhas, no fim de cada exemplar, estão impressas a duas colunas de cor esverdeada, e correspondem às rubricas “Documentos* Crónicas* Críticas* Comentários”. Por fim, seguem-se outras tantas folhas, não paginadas, em papel couché, brancas e brilhantes, ocupadas com publicidade.

RECENSÔES À REVISTA

Numa recensão, não assinada, duvida-se que a revista “Litoral conseguirá vencer”, pois “falou-se demasiado no seu aparecimento, sempre adiado, para que daí não resulte para ela certa desvantagem, pois às coisas muito reclamadas pede-se mais” e, por isso “o seu aspecto gráfico nos desiludiu”, de “gosto demasiado abonecado”, não próprio “para uma revista que pretende ter categoria artística, ao mesmo tempo que literária” assim como “o artigo em que se procura definir os objectivos da revista está longe de ter seriedade à altura dos seus respeitáveis propósitos.”(13)

12Cf. Nota da redação “Litoral”, n.º 5 (p. [116]).

13V. “Litoral – revista mensal de cultura – N.º 1 – Junho de 1944” – In O Globo, ano II, n.º 28 (1 de Agosto 1944, p. 12).

Rodrigues Lapa (1897-1989), em resposta negativa ao convite de colaboração literária, expõe uma opinião própria mas considera que a revista “é encantadora, verdadeiramente aliciante a sua apresentação gráfica; muito fina, aquela gaivota branca, voando no azul, ao rés da água cintilante. Tudo, enfim, dum esmerado bom gosto, que garante aliás uma longa experiência artística.”

Marcado como preso político, Manuel Rodrigues Lapa não condescende: “Ou muito me engano, ou o seu Litoral é concebido num espírito já muito conhecido de atrair elementos opostos. (…) De modo que tenhamos por entendido que só vou com os da minha igualha, e no barquinho onde navego só quero ter gente de confiança.”(14)

O crítico João Gaspar Simões (1903-1987), outro contemporâneo, publica uma longa análise crítica, focada nos conteúdos do primeiro número da revista, para exemplificar que “Litoral não pode ter um programa, porque não há programas que supram um estado de indeterminação funcional.” E que, “para «revista de cultura», e cultura de tal peso e quilate, a ligeireza da capa, a feminilidade do formato e o preciosismo do arranjo gráfico, aliás de bom gôsto, afiguram-se-me escabidos”, terminando, no entanto, com um elogio: “A documentação gráfica da revista é da melhor qualidade.”(15)

Incisiva, a estudiosa Clara Rocha (1955-) define-a como uma revista “contra uma literatura de militância sócio-política, polarizada em torno do movimento neo-realista” e destaca, em voz plural, “do conjunto dos seus volumosos seis números um poema que nos parece evidenciar a linha de rumo da publicação.

Trata-se de «O Amigo» [n.º 1, p. 64] de Carlos Queiroz, homenagem poética a Fernando Pessoa (16) [1888-1935], de que transcrevemos somente as estrofes centrais:

(…) A poesia era o tema dilecto
Da conversa que o tempo engolia.
O real, o preciso, o concreto
Nem sabiam que a gente existia.
Nada era por nós maculado,
Nem um só sentimento era fôsco:
Porque havia outra luz, outro lado,
E o mistério morava connosco. (…)” (17)

ALGUMA COLABORAÇÃO LITERÁRIA E PLÁSTICA

Aconselhamos a consulta do Índice I publicado pela revista, indispensável pela enorme colaboração que nele se regista, onde se contam mais de uma centena (14V). “Carta a um amigo, a propósito de uma colaboração”/ Rodrigues Lapa – In Seara Nova, ano XXIII, n.º 880 (24 Junho 1944, p. [115]) de colaboradores, dos quais cerca de 40 são autores plásticos e cerca de 70 são autores literários ou na área de crítica de arte com autoria diversificada.

15V. “Os Livros da Semana: II – Uma nova revista literária”/ João Gaspar Simões – In Diário de Lisboa, ano 24, n.º 7819 (30 Agosto 1944, p. 10).

16 Num aparte, não podemos deixar de referir a publicação póstuma, aqui, de “Uma poesia inédita de Fernando Pessoa (1888-1935) ”, no n.º 1 (p. 19).

17V. “Dos anos 40 ao experimentalismo (…): Litoral” – In Revistas Literárias do Século XX em Portugal/ Clara Rocha. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda,1985 (p. 484-485).

Passaremos, de seguida, aos colaboradores e matérias dos números cinco e seis da revista (não incluídos no Índice I). E porque se considera que esta é uma publicação que marcou presença como revista literária, começamos pelas colaborações poéticas: Ribeiro Couto, natural do Brasil, publica “São Domingos de Rana”, “Ria de Aveiro”, e “Impromptu do Estoril”, esta última sobre uma refugiada, mal vestida, no hotel Palace, de luxo, que termina assim:

“A gazela assustada
É Miss Lee enfermeira.
Parte esta madrugada
Pelo avião da carreira” (n.º 5, p. 5).

Continuamos com a poesia de José Blanc de Portugal 18 de temática fúnebre em “Elegia Segunda” (n.º 5, p. 22); Pedro Homem de Melo (1904-1984) deixou a sua marca poética na linha anterior, com “Cemitério” e “Palácio Comprado” (n.º 5, p. 47-48); Merícia de Lemos (1913-1996) oferece poesia existencialista em “Morte Aparente”, “Escuridão” e “A Grande Solidão” (n.º 6, p. 128-138); Alexandre O’ Neill (1924-1986) pontua, aqui, com poesia surrealista em “Explosão”, “Cavalos”, ”Nocturno”, e “Estátua Equestre” (n.º 6, p. 186-189); Adolfo Casais Monteiro (1908-1972), na vertente humanista, visível nas entrelinhas de “Acção de Graças”, e notoriamente no “Fragmento do Poema Europa (1944) “onde critica o horror da segunda guerra mundial “porque se visse – não acreditava”, e a neutralidade portuguesa:

“ (…) eu que não tenho parentes e amigos na guerra,
eu que sou estrangeiro diante de tudo isto,
Eu que estou na minha casa sossegada
A ouvir a cidade mansa, os ruídos familiares,
Que não tenho guerra à porta,
Eu porque soluço?
Quem chora em mim, dizei – quem chora em nós?” (n.º 6, p. 149- [152]).

18 José Bernardino Blanc de Portugal (1914-2000) foi cientista, musicólogo, crítico literário, investigador e escritor (poeta e ensaísta) português. Colaborou aqui, também, na secção apensa “Documentos*Crónicas*Críticas*Comentários”, com “Teoria e prática da música portuguesa”, no n.º 2 (p. 191).

19 António José Branquinho da Fonseca (1905-1974) foi um escritor português que se distinguiu como contista. Concluiu o curso de Direito em 1930, e foi nomeado Conservador do Registo Civil na Nazaré em 1936. Foi um dos fundadores e diretores da revista Presença. Deixou aqui, também, “Poemas do Mar” no n.º 3 (p. 259); e outro conto, sob o pseudónimo António Madeira, “Maresia”, com ilustrações de Bernardo Marques, no n.º 1 (p. 29). 20José Adjuto Castelo Branco Chaves (1900-1992) foi ensaísta, jornalista, crítico-filósofo e tradutor. Começou por ser monárquico mas, a partir de 1927, rende-se ao ideário dos searistas (revista Seara Nova, que ainda se publica em Lisboa, desde 1921), publicando aqui, também, o texto “Universalismo, Particularismo ou Cosmopolitismo”, ilustrado com um desenho de Cícero.

Agora passamos aos prosadores: Sant’anna Dionísio (1902-1991) disserta sobre “Sócrates, sofista” (n.º 5, p. 16); Branquinho da Fonseca (19) tem o conto “As mãos frias”, ilustrado por Carlos Botelho (1899-1982) em presença exclusiva (n.º 5, p. 56); Castelo Branco Chaves (20) reflete sobre releituras de Camilo em “Extractos de um diário” (n.º 6, p. 175- [180]); Harri Meier (1905- 1990), filólogo alemão, publica um estudo com exemplos portugueses, sobre “Os olhos verdes na literatura” (n.º 6, p. 190); Ademar Vidal (1900-1986) escreve sobre a cultura musical do seu país em “Folclore Brasileiro: cantigas de carregar piano e outros serviços pesados” (n.º 6, p. 197); Jacinto do Prado Coelho (1920-1984) critica “Pascoaes, cavaleiro do Graal” com um desenho de Júlio, e uma fotografia do visado (n.º 5, p. 70), e outro artigo na secção apensa, “Documentos*Crónicas*Críticas*Comentários” intitulado “Dignidade da palavra” (n.º 6, p. 216). Este último recebe, por sua vez, a recensão “Jacinto do Prado Coelho: A educação do sentimento poético …” de Hernâni Cidade21 (n.º 6, p. 227), autor de outro texto, “O Barroco e o Romântico são expressões da mesma constante histórica?”, ilustrado com um desenho de Ofélia Marques (22) (n.º 6, p. 166, p. [174]); Ruy de Aragão disserta “À roda de dois desenhos de Domingos Sequeira (1768-1837)” (n.º 5, p. 78); João de Castro Osório (1899- 1970) publica um estudo “Para a compreensão do neo-classicismo português: uma forma poética de aparência popular e de origem culta” ilustrado com duas gravuras (n.º 5, p. 26); Domingos Monteiro (1903-1980) apresenta as suas “Reflexões sobre a conduta do Homem e as suas contradições”, ilustrada com uma vinheta final (n.º 6, p. 121); Myron Malkiel-Jirmounsky (1890-1974), investigador russo da pintura portuguesa antiga, publica “Dissertação dos valores na História de Arte” utilizando pinturas de El Greco (cerca de 1598), e Cézanne (datado de 1885), e um desenho de A. Dacosta23 (n.º 6, p. 132).

Nesta revista, Olavo d’Eça Leal (24) é duplo autor, crítico de arte e ilustrador do conto “Os «Discursos» de Octávio Mendes: português do nosso tempo” (n.º 6, p. 153-165); assim como Diogo de Macedo (1889-1959) que ilustra o artigo “Porquê Museus” do pedagogo Adriano de Gusmão (1908-1993) que aborda a trilogia Escola-Biblioteca-Museu, com uma gravura “em ponta-sêca” (n.º 5, p. 49, p. [55]), e colabora na rubrica “Artistas portugueses”.

Dias, no n.º 1 (p. 11, p. [18]). Nesse texto, “em Litoral, logo no seu primeiro número, germes de dissidência?” – pergunta João Gaspar Simões na sua recensão à revista (V. nossa nota 15).

21 António Hernâni Cidade (1887-1975) foi professor e historiador literário português. Aqui, tem mais colaborações: o estudo “Acêrca da génese da poesia e das suas tendências iniciais”, no n.º 2 (p. 144), e a recensão a “A luta pela expressão. Prolegomenos para uma Filosofia da Literatura, de Fidelino de Figueiredo”, na subsecção apensa “Crítica”, no n.º 3 (p. 328).

22 Ofélia Gonçalves Pereira da Cruz Marques (1902-1952) foi uma artista (desenho, ilustração, caricatura) e pintora da 2.ª geração modernista portuguesa. Frequentou a FLUL, que abandona como Bernardo Marques, com quem viria a casar, adoptando o seu apelido. Ofélia Marques expõe pela primeira vez no II Salão de Outono, dos Modernistas (1926), na Casa Bobone; e depois na Galeria Calendas (1945), com anuncio aqui, com Bernardo Marques e outros artistas. Assume-se autodidacta e, apesar de ser conhecida como ilustradora de livros infantis, vence o Prémio de Pintura Souza-Cardoso em 1940. Aqui, também ilustrou “Minsk, conto por Graciliano Ramos”, com dois desenhos, no n.º 2 (p. 156, p.159).

23 António da Costa Jr. (1914-1990), que assina A. Dacosta, foi pintor, poeta e crítico de arte português. Natural de Angra do Heroísmo, Açores, fixa-se em Lisboa, em 1935. Reconhecido como pintor, também colaborou aqui, na secção apensa “Documentos*Crónicas* Críticas*Comentários”, com um desenho minimalista de Ribeiro Couto, no n.º 1 (p. 92).

24 Olavo Correia Leite D’Eça Leal (1908-1976) foi escritor, artista plástico e gráfico, actor, assistente de realização, e publicista português. Estudou em Paris, no estúdio de desenhos animados de André Vigneau, antes de ser locutor da Emissora Nacional portuguesa. Dramaturgo, com peças levadas à cena, colaborou aqui, antes, na subsecção apensa “Notas”, a ilustrar o texto “Perspectivas do Teatro português”, não assinado, no n.º 3 (p. 344).

RUBRICA E SECÇÃO APENSA

A única rubrica regular da revista é um misto de estudo crítico e artístico que pretendia divulgar “Artistas Portugueses”, mas abriu-se aos “Artistas Brasileiros” uma vez (n.º 3). Nela, os artistas focados colaboraram com várias obras, aqui reproduzidas: “o pintor Eduardo (Afonso) Viana (1881-1967)”, com uma fotografia de 1928; “o pintor Cícero Dias” igualmente com uma fotografia sua no “1.º Congresso Afro-Brasileiro. Pernambuco, 1929 (de Rebelo) ”, e “o pintor Dordio Gomes (1890-1976) ”, os três por Diogo de Macedo (n.º 1, p. 67; n.º 3, p. 311; n.º 5, p. 8); os escultores “Francisco Franco”, e “Canto da Maia (1890-1981) ”, com ilustrações de ambos, foram estudados pelo mais assíduo colaborador da revista, Luís Reis Santos25 (n.º 2, p. 133; n.º 6, p. 181); e “Maria Keil do Amaral” por Carlos Queiroz, igualmente ilustrado e com uma fotografia da visada (n.º 4, p. 418).

Mencionamos, em seguida, outros autores e conteúdos da secção apensa “Documentos*Crónicas*Críticas*Comentários” dos últimos números, o 5 e o 6. Assim, cronologicamente: o bibliógrafo Luís Silveira (1912-?), na sua única colaboração, apresenta e critica as “Cartas inéditas de Alexandre Herculano (1810-1877) e de Joaquim Heliodoro da Cunha Rivara (1809-1879)”, com um desenho humorístico de Alexandre Herculano por Saavedra Machado (1871- 1950), (n.º 5, p. 81); o filósofo Álvaro Ribeiro (1905-1981) crítica os políticos em “No meio está a virtude” (n.º 5, p. 87); Luís Reis Santos contextualiza, ainda, “O problema do teatro de S. Carlos”, ilustrado com um desenho de Francisco Keil do Amaral (1910-1975), (n.º 5, p. 91, p. 92); Vitorino Nemésio (26) publica a crónica “No centenário de Verlaine (1844-1896)”, ilustrado com o famoso desenho de Félix Régamey (1844-1907), “Verlaine e Rimbaud [1854-1891] em Londres” (n.º 6, p. 213); uma “Nota” póstuma de António Batalha Reis (1847- 1935) sobre “Uma carta inédita de Eça de Queiroz (1845-1900)”, (n.º 6, p. 220); Luiz Navarro Soeiro (1905-1965), critica o “Relatório sobre o estado de Ângelo de Lima (1872-1921)” do médico Miguel Bombarda (1851-1910), com uma autobiografia e um desenho do visado por Bernardo Marques e publicada antes, no n.º 4 (p. 449), agora “Sôbre o estado mensal de Ângelo de Lima” (n.º 6, p. 222).

25 Luís Reis Santos (1898-1967) foi professor, ensaísta, historiador e crítico de arte português. Bolseiro da Junta da Educação Nacional (1923-33), fez um estágio de formação técnica e profissional da Escola do Louvre, cursou sobre processos científicos no exame de obras de arte no Instituto Carlos Mainini, em Paris (1934), e estudou pintura antiga com auxílio de raios X, no Porto (1934-36). Completou os seus estudos com viagens à Europa, e a Portugal, e fez um Inventário particular e um documentário iconográfico da arte nacional portuguesa. Fez, ainda, um estágio no Museu Nacional das Janelas Verdes (hoje, MN de Arte Antiga), e foi nomeado conservador-adjunto dos museus (1944). Depois foi director do Museu Machado de Castro, em Coimbra, por concurso público (1951). Publicou muitos livros especializados, foi diretor gráfico de muitas publicações e colaborou em vários periódicos estrangeiros e nacionais, como nesta revista, onde deixou colaboração em todos os números (V. Índice I, p. VII, para os n.ºs 1-4).

26 Vitorino Nemésio Mendes Pinheiro da Silva (1901-1978) foi escritor (poeta, ficcionista, ensaísta, crítico, biógrafo), professor universitário, jornalista, historiador e publicista português. Nasceu na Vila da Praia da Vitória, Açores, e veio a Lisboa, pela primeira vez, como militar voluntário, em 1919. Começou os estudos superiores em Coimbra mas terminou-os em Lisboa, onde fica como professor catedrático na Faculdade de Letras até 1971. Começou por publicar poesia, Canto Matinal (1916) mas, depois de participar no congresso sobre os Açores, na Sociedade de Geografia de Lisboa (1939), apoiou o movimento regionalista para desenvolver “as suas ilhas”, que se constituíram numa Região Autónoma em 1974. Fundou e dirigiu, entre outras, a Revista de Portugal (Lisboa, 1937-1940), e colaborou em muitos periódicos. Aqui, publicou outras duas crónicas: “Parar, reparar e admirar” onde chama “indigna e desordenada” à “republica das letras portuguesas (sociedade pseudónima de responsabilidade vagabunda) ”, no n.º 1 (p. 84); e “Eugénio de Castro”, ilustrado com um desenho humorístico do biografado, por M. Gustavo Bordalo Pinheiro (1867-1920), no n.º 3 (p. 317). No mesmo ano, 1944, em que a Bertrand editou, aquela que seria a sua obra-prima, Mau Tempo no Canal, romance criticado aqui, por Albano Nogueira, como “um dos mais originais, mais fortes e mais completos dos que a nossa história literária dá conta até ao presente”, no n.º 4 (p. 459).

A subsecção “Crítica”, separada da anterior, inclui outras recensões polifacetadas: de Fidelino de Figueiredo (27) ao livro de “Karl Vossier [1872-1949]: Realismo e Religião na Poesia Luso-espanhola do século de ouro” (n.º 5, p. 93); do jurista-filósofo António José Brandão (1906-1984) à obra de “Luís Cabral de Moncada [1888-1974]: Direito positivo e Ciência do direito…”, ilustrada com um desenho de Júlio (n.º5, p. 94); de Fernão de Lisboa (28) sobre a “Exposição de desenhos de Júlio: Galeria Buchholz. Lisboa, 24 de Outubro” (n.º 5, p. 103); João de Freitas Branco (1922-1989) fala de “O 10º Concerto da Sociedade, “Sonata”. Academia dos Amadores de Música” (n.º 6, p. 224); António Conte (29) comenta três livros como “monólogos femininos” pois “a mulher tende a mesmizar (mesmo) e o homem a alterizar (outro)” referindo “Rachel Bastos: Um Fio de Música (novela, 1937); Destino Humilde (romance, 1942) e Coisas do Céu e da Terra (contos e novelas, 1944) ”, com uma ilustração de Mário Eloy (n.º 6, p. 229, p. 230); e o desconhecido Joaquim Magalhães analisa o livro de “Paulo Duarte: Língua Brasileira. Lisboa, 1944” (n.º 6, p. 232).

Seguem-se as “Notas da redacção”, assim designadas no Índice I da revista, não assinadas: “Crítica e conhecimento da literatura” resultante, idealmente, de um juízo científico e culto (n.º 5, p. 104); “Reacções do público português” ao teatro e obras variadas (n.º 5, p. 107); “Para além do historicismo” contemporâneo em excesso, ilustrado pelo retrato de Teófilo Braga (1843-1924), uma “gravura em madeira de António Lopes (1866-1942) ”, (n.º 5, p.110, p. 112); “A investigação científica na cultura portuguesa” influenciada, principalmente, por Augusto Compte (1798-1857), filósofo francês, (n.º 5, p. 112); “Revista do instituto de Cultura Alemã”, de Lisboa e o sumário do seu “1.º número” (n.º 5, p. 115); “O Romance e a sua dificuldade” (n.º 6, p. 237); e, o artigo numerado, incompleto: “Tópicos de Pedagogia: 1 – Função da Universidade” (n.º 6, p. 239). E, antes da publicidade, vêm os espaços informativos: “Registo Bibliográfico” (n.º 5, p. 115; n.º 6, p. 243); “Crítica” (n.º 1); “Aos senhores assinantes e leitores” (n.ºs 2-5); e “Litoral” (n.ºs 1-6).

27 Fidelino de Sousa Figueiredo (1888-1967) foi professor universitário, historiador de Literatura e de Crítica Literária, e publicista português. Contrário à ideia positivista que considerava a obra de arte um mero documento histórico ou biográfico, Fidelino de Figueiredo também publicou aqui o artigo filosófico “A Morte de D. João”, no n.º 4 (p. 374).

28 Com o pseudónimo Fernão de Lisboa, Carlos Queiroz assina aqui, talvez para separar as águas (V. nossa nota 2), outras duas críticas de arte na secção apensa “Documentos* Crónicas* Críticas* Comentários”: “O grande equívoco da Arte Moderna”, no n.º 1 (p. 89), e “Diogo de Macedo”, com as iniciais F. de L., ilustrado com um desenho do visado por J.L., no n.º 2 (p. 209). Carlos Queiroz tem outras colaborações aqui: poesia do seu tempo, “O Amigo”, que já mencionámos, “Teatro da Boneca” e “Vamos de mão dada”, no n.º 1 (p. 64-66); e duas crónicas, uma assinada com as iniciais C.Q: “Ribeiro Couto” no n.º 1 (p. 92), outra “Imagens da nossa medida”, na mesma secção, no n.º 2 (p. 188); e um estudo de crítico de arte na rubrica “Artistas Portugueses”, no n.º 4 (p. 418).

29 António Conte (?) criticou, nesta revista, outros dois livros: um foi pretexto para atacar o neorealismo português, de “Manuel da Fonseca: Cerromaior (romance)”, no n.º 2 (p. 203); e outro serviu para opinar que a mulher não deve escrever romances, “género impuro e complexo”, pois “não é talvez aquêle em que a alma feminina pode mais adequadamente espelhar-se” sobre o livro de “Maria Archer: Ela é apenas mulher”, no n.º 3 (p. 388).

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Nas contracapas exteriores, o local mais visível da revista, surge propaganda nacional ao gosto modernista da época, ilustrada em anúncios de página inteira, revelando duas preocupações do governo vigente: a alimentação em tempo de guerra, e a venda de produtos nacionais num universo de itens estrangeiros muito apelativos e modernos, num Portugal neutral e estagnado que exportava pouco mais do que “Atum, Sardinhas, Anchovas. As deliciosas conservas de peixe portuguesas despertam o apetite e alimentam”* (n.ºs 1, 2, 3, 4, 6). Neste espaço, há apenas uma exceção, com um anúncio comercial que está, ainda assim, ligado aos imprescindíveis transportes marítimos, muito procurados por refugiados, políticos ou outros que, então, só podiam estar em Lisboa em regime de trânsito para outros países, como “Mário Silva, agente de navegação. Telegramas, Marship. Telefones – 21084-29696. Escritórios: Rua das Flores, 81 – Lisboa” (n.º 5; repetido no interior dos n.ºs 2, 3, 4, 6).

*I.P.C.P. Instituto Portugues de Conservas de Peixe

A fechar os números da revista vêm os anúncios multitemáticos, não assinados e que são, maioritariamente, de página inteira e sempre a tinta preta, abusando da letra maiúscula e/ou a bold, características gráficas do movimento modernista: “Sociedade Corticeira Robinson Bros. Portalegre. Agentes: Azevedo & Pessi, Rua Nova do Almada, 46 – Telefone 29879, Lisboa” (n.ºs 1- 4); “The National Cash Register Company. Caixas Registadoras National. Sucursal da Fábrica da América, Lisboa – Rua Augusta 146 – Telefone 23920/ Porto – Rua de Santa Catarina, 312, 1.º – Telefone 1951” (n.º 1); “Philips” (n.º 1); “Companhia dos Grandes Armazéns Alcobia, Rua Ivens, 14, Esquina da Rua Capelo, Telefone 26441, Lisboa” (n.ºs 1-3); “Sanogyl, Dr. B. Kritchevski” (n.ºs 1, 3-4); “Galeria de Arte Marcador, Tel. 29680*3-A, Rua Nova da Trindade*Lisboa” (n.º 1); “Kodak, Rua Garret, 36. Lisboa”, com fotografias quase sempre diferentes (n.ºs 1-4); “António Ferreira Pinto, Proprietário/Representante” (n.º 1); “Rolex: Oyster” (n.ºs 1-2); “A Melhor Lâmpada Tungsram, Krypton” (n.ºs 1-3); “Real Companhia Vinicola do Norte de Portugal. Fornecedora da Presidência da República. Sede, Vila Nova de Gaia. Filial, R. do Alecrim, 117 a 121. Tel. 22556” (n.ºs 1-2); “Calendas (Galeria), antiguidades, Rua das Chagas, 17, Lisboa” (n.ºs 2-6); “A Pompadour, Lisboa: Rua Garrett, 28, Rua Augusta, 140” (n.ºs 1, 3-4); “La Preservatrice, Rua Nova da Trindade, 2, Lisboa, Tel. 29193-29194” (n.º 2); “Palmares, chapéus” (n.º 2); “Stop, Estúdio de Arte. Rua Nova da Trindade, 6-A, Tel. 28498” (n.ºs 3-4); “Pelaria Modelo, Rua da Prata, 279, Lisboa, Telefone 28305” (n.º 5); e “Instituto Pasteur de Lisboa, 50 anos: 1895-1945. R. Nova do Almada, 69” (n.º 6).

Nas folhas de papel couché também se publicaram anúncios de meia página, provavelmente a título gratuito, como a agência que assina a maioria dos anúncios nesta revista, a “APA, Agência de Publicidade Artística, Rua Nova da Trindade, 3*Telefone 27244, Lisboa” (n.ºs 2-3); e os de divulgação literária de publicações com responsáveis que são colaboradores aqui, na revista Litoral:

“Aventura: revista portuguesa. Director: Rui Cinati30” (n.º 3); “Luís Reis Santos, Estudos de Pintura Antiga“ (n.º 3); “Cadernos de Poesia [1940-1953], Organizadores e Editores: Tomás Kim31, José Blanc de Portugal, Ruy Cinatti” (n.º 4).

Por Helena Roldão

Hemeroteca Municipal de Lisboa, 19 de Junho de 2018.

 

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira. Lisboa-Rio de Janeiro: Editorial Enciclopédia, 1978.

ROCHA, Clara – Revistas Literárias do Século XX em Portugal. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda,1985.

READ, Herbert (Org.); PÈREZ, Teresa Louro, trad. – Dicionário da Arte e dos Artistas. Lisboa: Edições 70, imp. 1990.

ANDRADE, Adriano da Guerra – Dicionário de Pseudónimos e Iniciais de Escritores Portugueses. Lisboa: Biblioteca Nacional, 1999.

PIRES, Daniel – Dicionário da Imprensa Periódica Literária Portuguesa do Século XX (1941-1974), Vol. II, 2º tomo. Lisboa: Grifo-Editores e Livreiros, 2000.

MATOS, Álvaro Costa de, e OLIVEIRA, João Carlos (Coord.) – O JOGO DA POLÍTICA MODERNA! Desenho Humorístico e Caricatura na I República.

Catálogo da exposição. Lisboa: Câmara Municipal de Lisboa – Grupo de Trabalho para as Comemorações Municipais de Cultura, 2010.

30 Ruy Cinatti (Rui Cinati) de Vaz Monteiro Gomes (1915-1986) foi engenheiro agrónomo, meteorologista aeronáutico, poeta viajante na linha do Orpheu, e publicista português. Doutorou-se por Oxford, Inglaterra, em Etnologia e Antropologia Social (1961). Viveu alguns anos em Timor, que foi um dos seus objetos de estudo e de publicações; em Timor foi secretário do governador e chefe dos Serviços Agronómicos. A partir de 1957, tornou-se colaborador da Junta de Investigações Científicas do Ultramar. Recebeu vários prémios literários e científicos. Fundou, dirigiu e colaborou em vários periódicos, como neste, onde publicou “Diário do estudante nómada: a viagem ao Algarve”, com fotografias suas, entre folhas, e uma “gravura em madeira de Marta/Mart Huguenin (outra no n.º 2, p. 124)”, no n.º 4 (p. 437, p. [448]).

31 Tomás Kim é pseudónimo de Joaquim Tomás Monteiro de Grilo (1915-1967), que foi professor universitário, ensaísta, tradutor e poeta português. Nasceu no Lobito, Angola e formou-se pela FLUL em Filologia Germânica, onde foi docente e divulgador, entre nós, da literatura inglesa e americana. Aqui, colaborou duas vezes: na subsecção apensa “Crítica” ao livro de “Cabral do Nascimento: Cancioneiro, 1943”, no n.º 2 (p. 206); e com “Quatro Poemas”no n.º 3 (p. 282-285).

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