Palmas e Trindade Lda - fábrica de conservas Tavirense
Joaquim Barrote Trindade, o remetente, sócio gerente da firma “Palmas e Trindade Lda”, proprietária da fábrica de conservas Tavirense, pedir autorização para incluir “no desenho de algumas das suas marcas de conserva o brazão d ́armas desta cidade”.
Nesta tampa, podemos observar a antiga representação heráldica da cidade: um escudo com uma ponte de um arco tendo duas torres nas extremidades, por onde navega um navio à vela.
Porém a 6 de Março de 1933, a heráldica de Tavira foi reformulada. A ponte passou a ter sete arcos (em conformidade com a actual). A inclusão das cabeças dos reis cristão e mouro, evoca as antigas armas do Reino do Algarve, e a colocação da Cruz de Santiago remete para o importante papel da Ordem de Santiago na reconquista de Tavira.
“Prova” de tampa de “Atum em Azeite, 1a Qualidade”, Palmas e Trindade, Lda
Tampa em Folha-de-Flandres associada a Carta em “Papel Almaço azul de 25 linhas” Arquivo Municipal de Tavira 1923
Texto em Tavira Patrimónios do Mar
Câmara Municipal de Tavira
Museu Municipal de Tavira Palácio da Galeria
2008
II. O século XX tavirense e a implantação da indústria conserveira
A vitória republicana, obtida em Outubro de 1910, tem epicentro em Lisboa e depressa se propaga às restan- tes províncias do país, sim, porque já não tem cabimento pronunciar o termo reino. Dias depois a essa data que derruba o regime monárquico, toma posse em Tavira a Comissão Municipal Republicana, executivo presidido pelo Dr. António Padinha, cargo que conserva até ao seu óbito, ocorrido em Novembro de 1916. 15
15 – Arnaldo Casimiro Anica, ob. cit., pp. 165-166
É ele também que lidera a Comissão Organizadora do Centro Republicano de Tavira, organismo que cola- bora – além das comissões políticas do Partido Republicano Português – na divulgação propagandística dos ideais e das ambições per lhadas pelo regime político recém instaurado 16. Na primeira reunião, marcada para Novembro de 1911, as atenções do plenário não estão apenas concentradas na discussão da orientação políti- ca deste centro republicano, no exame das contas ou na eleição do mandato, conforme estava determinado na ordem de trabalhos, mas também nas melhorias que a cidade deveria abrigar nos próximos tempos, dissertação que o Dr. António Padinha faz questão de abordar na sua comunicação. Estão entre as prioridades – por sequência de importância – a luz eléctrica, a indústria das conservas de peixe e a dragagem do porto 17. De qualquer forma, a não ser a cadeia civil, na Atalaia, o matadouro de gado, na Bela-Fria, e o cemitério público, no sitio de São Pedro, nenhum outro investimento de assinalável envergadura teria concretização, pelos menos nos anos imediatos ao discurso do Dr. Padinha, o próprio que promete minorar o desgosto dos tavirenses provocado pela saída da Banda Regimental para Faro em 1915 com a instalação de fábricas de conserva 18.
Nem de propósito, nesse mesmo ano, o Povo do Algarve noticia em primeira página que está de nitivamente assente a próxima creação de uma grande fábrica para conserva de peixe cujo capital – cincoenta mil escudos – foi subscrito pelos acionistas da Companhia de escarias Balsense, no Algarve 19.
Provavelmente a Companhia do Barril seguir-lhe-á o caminho, hipótese avançada pela redacção desse periódico tavirense, depois de ter escutado que fazia parte dos planos dessa arma a construção e montagem de outra fábrica havendo a família Padinha, subscrito 24 contos e devendo o restante capital ser dividido por alguns acionistas importantes e pelo público que o deseje 20. Intenções do agrado de todos, que só mais tarde tomarão corpo, até lá, dois anos volvidos desde a saída do Regimento de Infantaria nº4 21, muita tinta fará correr a imprensa local.
Numa entrevista concedida ao Povo do Algarve em Agosto de 1915, o director geral da Balsense, o Coronel José Vicente Cansado, elogia o entusiasmo que gira em torno da instalação de fábricas de conserva em Tavira, mas por outro lado lamenta o atraso da iniciativa, estando em vantagem nesse particular a localidade de Vila Real de Santo António, que tem inscritos no seu território desde os anos 60 do século XIX 22 modernos estabelecimentos fabris para enlatados de peixe. Desde então todo o pescado amealhado pelas armações de atum de Tavira é desviado para a lota vilarealense, um dos pontos mais importantes de venda de atum e sardinha na região, visto que na cidade do Gilão a indústria conserveira desperdiçara oportunidades de se xar, algo que a ser diferente – na opinião de José Vicente Cansado – traria (…) outras manifestações de progresso e evitaria a perigosa decadencia a que chegamos 23. Desta vez é que é a sério, ou não circulasse no Povo Algarvio a novidade que muito em breve vamos ter em Tavira uma fábrica de conservas e preparação de peixe, propriedade dos nossos patrícios srs. Joaquim Marques Cruz e Carlos Rodrigues Mil-Homens 24. Nome escolhido parece já ter, Gilão, em homenagem ao rio que banha a histórica cidade, mas até que labore nada mais resta senão esperar pelas próximas notas informativas da imprensa de Tavira.
Em passo acelerado, um escritor lisboeta de visita pelo Algarve, vê a cidade de Tavira como quasi todas as terras algarvias, incaracteristica e triste, dando a quem chega a impressão de que a vida, a acção e o movimento a abandonaram, deixando-a inerte, a morrer lentamente 25. Se ao menos uma fábrica de conservas tivesse aqui residência, suspira o marítimo que conversa com Adelino Mendes, o jornalista da Capital, a cidade de Tavira sairia fortalecida e depressa faria anular o juízo dramático que os visitantes se possam sentir tentados em apregoar.
Os preparativos para a instalação das tão ansiadas casas fabris vão progredindo ao ritmo possível. Disso andam a tratar o senhor Coronel José Vicente Cansado e o senhor Pedro Mendes, directores da Balsense, que se têm encarregue de estudar todos os aperfeiçoamentos introduzidos nas melhores instalações do Algarve 26. Um pouco mais problemática tem sido a escolha e a aquisição dos futuros terrenos para a colocação da Balsense. Junto ao Forte do Rato é uma hipótese descartada, dadas as delongas e os complicados tramites que o processo demonstrou ter.
16 Maria Cândida Proença, “O Algarve e a implantação da República”, in O Algarve da Antiguidade aos nossos dias (elementos para a sua história), Lisboa, Colibri, 1999, p. 477.
17 Arnaldo Casimiro Anica, ob. cit., p. 158.
18 Idem, ibid., p. 251.
19 O Povo do Algarve, 8 de Agosto de 1915, Ano II, p. 1.
20 Idem, ibid., p. 1.
21 Arnaldo Casimiro Anica, Anica, Tavira e o seu termo: Memorando Histórico, vol. II, Tavira, Câmara Municipal de Tavira, 2001, pp. 58-59.
22 Joaquim Manuel Vieira Rodrigues, “Vila Real de Santo António, centro piscatório e conserveiro”, in O Algarve da Antiguidade aos nossos dias (elementos para a sua história), Lisboa, Colibri, 1999, p. 417.
23 O Povo do Algarve, 15 de Agosto de 1915, Ano II, p. 2.
24 Idem, 30 de Outubro de 1915, Ano II, p. 1
25 Idem, 3 de Outubro de 1915, 2.a Série, n.o 8, Ano II, p. 1.
26 Idem, 24 de Outubro de 1915, Ano II, p. 1.
A alternativa reside agora nuns metros quadrados que estão em nome de Sebastião José Teixeira Neves de Aragão, parte deles a funcionar como estrumeira municipal, situados à sahida da cidade de Tavira ao lado direito da E.N. Nº78 para Vila Real de S. António 27. A Tavirense, por seu lado, convoca assembleias-gerais com os accionistas, perspectivando no final de 1915 estabelecer o montante do capital social da empresa, acertar o modo de cobrança e delegar poderes à direcção para fazer a escritura da sociedade e adquirir os terrenos para edificar a fábrica 28. Quase pronta a abrir, na rua José Pires Padinha, avista-se a fábrica Gilão, que ultima a montagem da caldeira a vapor e estufas e dos aparelhos de aquecimento e iluminação 29.
Em Novembro de 1915 a cidade de Tavira confirma pelos seus próprios olhos o início da laboração da fábrica de conservas Gilão, acorrendo a visitá-la uma verdadeira romaria. Estão empregadas nesse estabelecimento entre 30 a 40 mulheres. À venda do público estão latas de sardinha e chicharro em folha branca, que em breve terão a personalizá-las uma imagem de Tavira inspirada num postal ilustrado, na qual se poderá reconhecer uma parte bonita da cidade em que se ve o rio, a ponte árabe e alguns campos arborisados a montante 30.
Um ano depois a pesca do atum em Tavira pouco promete: as capturas são pobres e as receitas mal cobrem o investimento realizado pelas armações. Nada que faça vergar a actividade das únicas fábricas de conserva assentes em Tavira: a Gilão e a Santa Maria, esta propriedade dos srs. Manuel Caleça e filho 31, a laborar ao que se desconfia no largo Dr. Parreira, se pensarmos que a autarquia delibera alienar em hasta pública duas parcelas de terreno para acomodar fábricas de peixe – uma no largo José Pires Padinha, morada da Gilão, e a outra naquele ponto da cidade 32.
As principais e maiores, Balsense e Tavirense, entram em cena em 1917. Uma vez testados com sucesso em Abril desse ano os equipamentos da fábrica Balsense 33, é previsível que não dure muito até ao momento da inauguração. Esse acontecimento tem lugar no mês seguinte, mais precisamente no dia 9 de Maio, tendo a direcção da Balsense convidado os accionistas, direcção da fábrica A Tavirense e proprietários das outras fábricas a assistir à inauguração dos seus trabalhos 34. Logo a seguir é o turno da Tavirense, estávamos em meados de Junho. Vencidas dificuldades de vária ordem pela direcção desta fábrica, nomeadamente a falta de cumprimento de contratos de alguns fornecedores, dá-se início à laboração de mais uma unidade industrial, que perfaz um total de quatro a operar em Tavira nas primeiras décadas do século XX, o que dentro de poucos anos trará um grande incremento a esta cidade. 35
27 Idem, ibid., p. 1.
28 Idem, 7 de Novembro de 1915, Ano II, p. 2.
29 Idem, 24 de Outubro de 1915, Ano II, p. 1.
30 Idem, 28 de Novembro de 1915, Ano II, 2.a série, n.o 16, p. 2.
31 Idem, 13 de Julho de 1916, Ano II, 2.a Série, n.o 47, p. 3.
32 Idem, 16 de Janeiro de 1916, Ano II, 2.a Série, n.o 23, p. 2.
33 Idem, 26 de Abril de 1917, Ano III, n.o 86, p. 2.
34 Província do Algarve, 13 de Maio de 1917, Ano IX, n.o 436, p. 2.
35 Idem, 17 de Junho de 1917, Ano IX, n.o 441, p. 1.
Fábricas em Tavira
Companhia de conservas Balsense
Fábrica de conservas Gilão
J. J. Celorico Palma – A Tavirense
Santa Maria
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Câmara Municipal de Tavira
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