Biografia pessoal de Clemente Menéres
Clemente Joaquim da Fonseca Guimarães Menéres (1843-1916) nasceu no lugar de Cruz, concelho de Santa Maria da Feira, distrito de Aveiro, a 19 de novembro de 1843 e faleceu a 27 de abril de 1916 em Vila Nova de Gaia (na sua Quinta da Avenida), estando sepultado no cemitério de Agramonte, freguesia de Massarelos, concelho e distrito do Porto.
Era filho de Manuel Joaquim de Faria e de Ana Margarida Rosa. Neto paterno de Manuel Francisco dos Reis e Maria Josefa de Faria, e neto materno de José Ferreira Dias e de Ana Rosa. Foi batizado sete dias depois de nascer (1843-11-26). Frequentou em Vila da Feira as aulas do mestre régio local.
Clemente Menéres era filho de pais lavradores e industriais, que para além de cultivarem os terrenos agrícolas de que eram proprietários, possuíam uma serralharia. Iniciou a sua atividade profissional desde muito cedo nessa oficina da família, que empregava cerca de 40 operários, começando a sua aprendizagem logo após ter terminado a instrução primária. A serralharia dos pais era especializada em fechaduras e vendia a maioria da sua produção para a cidade do Porto, seguindo outra parte o caminho da exportação para o Brasil.
Quando contactado por um tio emigrante no Rio de Janeiro que pretendia regressar a Portugal e passar o negócio a dois sobrinhos, viaja para o Brasil em 1859. Assim, aos 15 anos embarca para esse destino no barco “Olinda”, onde chegou no dia 15 de agosto de 1859 (41 dias depois). No entanto, quando lá chegou, o armazém já se encontrava em liquidação, devido a conflitos do seu tio com o outro sobrinho. Nessa altura, arranjou ocupação nos trabalhos agrícolas da “chácara” do seu tio no Catumbi, durante cerca de 1 ano, até à liquidação final desse estabelecimento em meados de 1860.
(O seu “tio brasileiro” estabelecido no Rio de Janeiro, chamava-se Luís António Ferreira Guimarães da Cruz. Nasceu em Vila da Feira a 8 de junho de 1816 e era casado com Leonor Maria Guimarães, tendo ambos 2 filhos. Viria a falecer na freguesia de Cedofeita, concelho do Porto a 19 de agosto de 1891.)
A 18 de agosto de 1860, Clemente Menéres casou-se com a sua prima Maria da Glória Guimarães da Cruz, cumprindo-se assim outro hábito arreigado dos comerciantes portugueses ali residentes: chamar os sobrinhos com o objetivo de lhes passar a loja de comércio e casá-los com as suas filhas, canalizando os filhos (do sexo masculino) para outras atividades.
O seu sogro ofereceu-lhe emprego na sua propriedade agrícola, mas Clemente Menéres procurou a sua independência económica, arranjando emprego como caixeiro num armazém da família Serpa Pinto (propriedade de outro emigrante do Porto ali estabelecido), tendo desde logo demonstrado as suas capacidades para os negócios.
Quatro anos depois de ter ido para o Brasil, em 1863, regressou a Portugal com o tio e sua família, estabelecendo-se no Porto, na Rua da Torrinha, crente na promessa de ajuda financeira do sogro para cá se estabelecer. Tal facto não aconteceu, o que leva Clemente a afastar-se do tio/ sogro por desavenças relacionadas com dinheiros, mas facilitou-lhe o adiantamento da herança que a sua filha iria receber.
Clemente procurou então emprego tentando capitalizar o “saber-fazer” adquirido como caixeiro no Rio de Janeiro, colocando um anúncio no jornal como “indivíduo sabedor de escripturação por partidas dobradas”, conseguindo de imediato um emprego.
Em 1867, com o dinheiro da herança da sua mulher, e por ação do seu pai, arranja um sócio capitalista, João Joaquim Paes (de Vila da Feira mas residente no Porto), e 3 contos de reis para montar um negócio. Assim, tentando começar uma nova vida, fez sociedade com um capitalista, que entra praticamente com todo o capital e Clemente Menéres com o trabalho.
Desde a constituição da sua primeira empresa que Clemente passou a usar o apelido “Menéres”, com o intuito de se afastar do sobrenome Guimarães e por considerar tratar-se de um apelido diferenciador para as relações comerciais, acabando assim por ficar por estes dois nomes comummente conhecido e inclusivé assinando como tal.
No início do seu percurso de vida, Clemente Menéres percorreu a Europa Central e de Leste e o Médio Oriente à procura de mercados. Fez parte de várias sociedades, foi comerciante, produtor e exportador, tendo passado por várias conjunturas de diferente feição, umas mais e outras menos favoráveis aos seus negócios.
Ocupou vários edifícios, conforme o volume de negócios e a necessidade ou não de expansão o ditavam, mas foi nas instalações do antigo Convento de Monchique, ainda hoje na posse da família, que manteve a maior parte dos negócios, embora, em finais do séc. XIX, transferisse alguns desses negócios para Matosinhos, para um complexo industrial construído de raiz para o efeito.
Fundou imensas sociedades para exportar produtos portugueses, nomeadamente vinhos, azeite, cortiça e conservas. Criou a primeira fábrica conserveira e a primeira fábrica de rolhas em Portugal.
Clemente Menéres participou em muitas feiras na Europa e na América do Norte e do Sul e fazia publicidade das suas empresas na imprensa, assim como a participação em exposições era uma preocupação sua.
Este empresário notabilizou-se também como um grande exportador de vinhos, percorrendo vários mercados externos para colocar os seus produtos.
[ver descrição mais detalhada das várias empresas na “História Administrativa”].
Durante alguns anos dirigiu a Associação Comercial do Porto (que era sócio), fez parte dos corpos gerentes da Associação Industrial Portuense (1891/ 1892), sócio da Real Associação Central da Agricultura Portuguesa e de várias instituições de instrução e beneficência nesta cidade. A Câmara Municipal do Porto deu o seu nome à rua a norte do Jardim do Carregal, junto ao Hospital Geral de Santo António.
Clemente Menéres deixou uma grande herança que, embora tivesse alguns capitais dispersos sob a forma de ações ou quotas nalgumas empresas, de terrenos e de várias casas de morada, era na sua maior parte constituída pela participação que detinha na “Sociedade Clemente Menéres, Limitada” que se centralizou em Trás-os-Montes. No seu testamento, deixou 1500$00 em papéis de crédito para rendimento com a finalidade de serem distribuídas esmolas a pobres da freguesia de Miragaia, Porto (onde está localizada a SCM no antigo Convento de Monchique), e aos de Vila da Feira (sua terra natal); assim como deixou 6 contos em rendimento para os pobres das 49 freguesias por onde (à data da sua morte) se espalhavam as suas propriedades de Trás-os-Montes; doou ainda 1 conto para a “Ordem de S. Francisco no Porto”, e 4 contos para o “Hospital de Mirandela”. Todas estas doações foram realizadas pela “Sociedade Clemente Menéres, Limitada”.
Clemente Menéres foi assim um grande empresário da segunda metade do séc. XIX. Teve negócios bem diversificados entre si, fundando imensas sociedades para exportar produtos portugueses, nomeadamente vinhos, conservas e cortiça, ficando por isso conhecido como comerciante, industrial e um dos maiores exploradores agrícolas portugueses a nível de sobreirais no norte de Portugal.
História administrativa de cada uma das diversas empresas: Clemente Menéres - Percurso profissional / Negócios / Empresas
Para compreender de uma forma mais integrada este arquivo pessoal predominantemente ligado à prática profissional de Clemente Menéres, julgamos necessário referir o percurso que este teve em várias empresas, pois assim é mais inteligível a visão negocial deste empresário, a conceção agregadora que detinha de exploração, produção e exportação dos diversos produtos (maioritariamente produtos agrícolas), bem como a sua perceção e entendimento de organização e gestão empresarial.
Referirmos assim, também as empresas “antecessoras” à Sociedade Clemente Menéres Limitada (ver fundo relacionado em “unidades de descrição relacionadas”) (só com outros sócios e estatutos muito diferentes ao longo dos anos), pois conhecendo e compreendendo as outras empresas (extintas ou em atividade na altura de fundação da PT/ADPRT/EMP/SCM) e a família Menéres: a análise a este fundo arquivístico, é mais global e não tão específica, verificando-se que Clemente Menéres era ainda sócio e/ou gerente de outras empresas com os filhos, sendo a organização e função de umas, entrecruzadas com outras.
Lista resumo de empresas nas quais Clemente Menéres era sócio e/ou sócio-gerente:
1867-1874 – Paes & Menéres
1874-1879 – C. Menéres & Companhia (1876 – novos sócios)
1879-1887 – Santos, Cirne & Companhia
1888-1895 – Clemente Menéres & Filhos
1895-1905 – Menéres & Companhia
1902- ___ – Sociedade Clemente Menéres, Limitada
Paes & Menéres (1867-1874) – Clemente Menéres iniciou a sua atividade empresarial com João Joaquim de Paes, investidor indicado pelo pai, com o qual constituiu, em 1867, a sociedade “Paes & Menéres” com sede na Rua da Ferraria, Porto. João Joaquim de Paes era um capitalista, também natural de Vila da Feira, residente no Porto, que nesta empresa entrou praticamente com todo o capital, ficando a gestão a cargo de Clemente Menéres.
Esta sociedade em comandita fabricava produtos em cortiça para exportação, e comercializava e distribuía vários produtos de drogaria e alimentares para a cidade do Porto e província, Europa e Brasil. A unidade de produção de cortiça situava-se no antigo Convento de Monchique. Esta empresa vendia sobretudo vinho, rolhas, palitos e ferragens para o Brasil, e frutas para Alemanha, França e Inglaterra.
Em 1872, ao longo de seis meses, Clemente Menéres percorre o Brasil e as Repúblicas do rio da Prata em negócios (onde começa a nascer a ideia de uma Fábrica de conservas) e no ano seguinte várias cidades da Europa, em exposições e negócios (em Áustria, Rússia, Alemanha, Holanda, Bélgica, Inglaterra).
C. Menéres & Companhia (1874-1879) – Em 10 de abril de 1874, João Joaquim de Paes (por idade avançada) cede-lhe a sua parte na sociedade, que passa a designar-se “C. Menéres & Companhia”, passando Clemente Menéres a ser o único sócio e gerente desta. Posteriormente, no final desse mês, entraram como sócios Joaquim Silvano Filho, a assegurar o expediente na sede no cais da Alfândega do Porto (na parte oriental do edifício do antigo Convento de Monchique) e Álvaro Carneiro Geraldes (filho de uma tradicional família de comerciantes do Porto com grande ligação ao Brasil), que se deslocou de imediato para o Brasil como representante da empresa no Rio de Janeiro, para controlar e ampliar as exportações. Clemente Menéres estava encarregue de procurar potenciar os ganhos a montante assegurando o abastecimento de matéria-prima (cortiça) a preços e quantidades mais convenientes.
Em maio de 1874 desloca-se a Trás-os-Montes, aos concelhos de Bragança e Mirandela (no Quadraçal), com o objetivo de investir na produção de cortiça e controlo das áreas de cultivo do sobreiro, tendo inclusivamente escolhido o lugar do Romeu para residir.
Em apenas sete dias, tinha já 38 títulos de compra de propriedades agrícolas e mais tarde contratou vários corticeiros do Alentejo. No entanto, a extração de cortiça na região revelou-se extremamente difícil, dadas as condições acidentadas do terreno e a dificuldade de acesso a veículos de carga.
A 9 de março de 1876, uma resolução do Tribunal do Comércio do Porto dissolveu a “C. Menéres & Companhia” por causa de uma demanda que os 2 sócios de Clemente Menéres tinham feito por divergências com ele sobre a gestão da empresa, resultando em indemnizações para ambos os sócios.
Nesse mesmo dia, a firma “C. Menéres e Companhia”, reorganiza-se com novos sócios, numa sociedade em comandita, e vai associar-se a Raul Cirne e António Tomás dos Santos, tendo a sociedade o mesmo nome que a anterior e como objetivo a continuação da mesma, com o património da “Companhia Luso-Brasileira – Fábrica de Conservas Alimentícias” em Monchique (Porto) e a “Fábrica de Conservas de Silvade” em Espinho, e onde Clemente Menéres iria fornecer a essa sociedade, a cortiça dos seus sobreiros de Mirandela e Macedo de Cavaleiros.
Clemente comprometeu-se a vender a esta sociedade a cortiça com abatimento de 5% em relação aos preços correntes naquela região e também a ceder à empresa as rolhas e cortiças lá fabricadas por sua conta para revenda, com uma comissão de 20%. Os lucros eram distribuídos por metade para Clemente Menéres e por 1/4 a favor de cada um dos outros dois sócios.
Com o produção de cortiça de Trás-os-Montes a ganhar forma e o fornecimento de cortiça a ser deficitário, devido ao custo e demora no escoamento dos produtos a impedir o eficiente desenvolvimento do mesmo, esta fábrica de cortiça instalada no antigo Convento de Monchique (Porto), passou rapidamente a depósito desta matéria-prima, pois Clemente Menéres instalou a fábrica de cortiça em Mirandela junto da ribeira do Quadraçal, designada atualmente por “fábrica velha”, (com 2 unidades fabris em Carriço e Horta da Massada, assim como uma casa para os corticeiros em Vila Verdinho e um posto de vigia no Pico do Quadraçal), e passou a enviar a sua produção para o Porto.
Companhia Luso-Brasileira – Fábrica de Conservas Alimentícias – Na segunda metade da década de 1870, Clemente Menéres procurou dedicar-se também à transformação de produtos originários de Trás-os-Montes. Fundou assim a “Companhia Luso-Brasileira – Fábrica de Conservas Alimentícias”, com sede na Rua da Restauração, Porto, em espaços alugados a João Joaquim de Paes (o seu primeiro sócio), a qual produzia conservas de peixes, carnes, frutas, legumes e doces. A fábrica foi pioneira no Norte do país na introdução do método conserveiro Appert (nova técnica francesa de conservação de alimentos em latas).
Assim, em paralelo com a “C. Menéres & Companhia”, esta “Companhia Luso-Brasileira” funcionava como 2.ª unidade dessa firma.)
Clemente Menéres entre 1876 e 1877 contraiu o seu primeiro empréstimo bancário para compra de propriedades agrícolas e quando não comprou as terras optou por comprar apenas os sobreiros (em zonas de cultivo de cereais).
Em 1887 realiza outro contrato com 4 bancos com hipoteca de todas as suas terras no nordeste transmontado.
[Dados relativos a 1878, indicam que as exportações das empresas de Clemente Menéres para o Brasil (destinadas ao Rio de Janeiro, Santos, Baía e Pará), passavam essencialmente pelo azeite e pelo vinho, mas também por pequenas quantidades de corda, cal, cestos de vime, fechaduras, ferragens, linho, fruta, palitos, rolhas, peixe, rosários e torneiras. A nível europeu para Inglaterra, Alemanha, Suécia e França (destinadas a Londres, Hamburgo, Gotemburgo, Estocolmo e Bordéus, respetivamente), a cortiça era o produto exclusivo sob a forma de rolhas, aparas ou fardos e feixes de pranchas.]
Santos, Cirne & Companhia – sucessores de Paes & Menéres (1879-1887) – A 1 de fevereiro de 1879 entra como sócio na empresa, Constantino Joaquim Paes (filho de João Joaquim Paes), passando a firma a designar-se “Santos, Cirne & Companhia – sucessores de Paes & Menéres”. A gerência era assumida em pleno pelos 2 sócios António Tomás dos Santos e Raul Cirne, embora sujeitos a um conjunto de condições.
Em 1881 a fábrica da “Companhia Luso-Brasileira – Fábrica de Conservas Alimentícias” tinha já uma sucursal: a unidade de produção, em Espinho. Esta fábrica de conservas de sardinha de Silvade (que passou por trespasse à “Brandão, Gomes & Companhia” em 1884), servia para a preparação de sardinha em azeite.
Por essa altura, a fábrica da Rua da Restauração apresentava alguma debilidade por estar instalada numa casa de habitação arrendada (inicialmente a João Joaquim de Paes e depois a seu filho e sócio comanditário Constantino Joaquim Paes), onde funcionavam duas cozinhas e havia uma oficina de funilaria para construir e manipular as latas, dando trabalho a 50 operários que subiam sazonalmente aos 120 por ocasião da colheita da fruta.
Na atividade negocial destacavam-se as frutas, marmelada e geleias, azeitona, tomate e peixe, as quais eram exportadas em grande parte para o Brasil e as Repúblicas do rio da Prata. As vendas em Portugal representavam apenas cerca de 10% e outro tanto representava a exportação para Inglaterra.
Por outro lado, a fábrica de cortiça do antigo Convento de Monchique (juntamente com o antigo armazém da Alfândega do Porto), era a única existente no Porto de produção de cortiças e seus derivados, realizando-se manualmente todo o trabalho, cortando-se as rolhas à “moda nacional e à catalã”. Anteriormente, ensaiaram o fabrico mecânico, mas abandonaram esse método por ser menos perfeito e mais caro. A sua produção atingia o volume de 300 toneladas de prancha e ocupava como pessoal operário 25 homens e 2 mulheres.
Em 1883, os negócios do Porto estavam agora estatutariamente entregues aos 2 gerentes António Tomás dos Santos e Raul Cirne, pois Clemente Menéres vivia na sua Quinta do Romeu, Mirandela, onde também tinha a sua empresa agrícola para produzir frutas, vinho e sobreiros, e também instalou uma fábrica de produção de cortiça que exportava principalmente para a Alemanha e para o Brasil, recebendo deste último ainda importantes encomendas de azeite em almotolias, para além dos vinhos tratados que enviava para Gaia.
Em 9 de julho de 1885, os sócios comanditários Clemente Menéres e Constantino Joaquim Paes abdicaram de 1/3 da sua quota a favor de um 5.º sócio, Porfírio de Macedo, que passou a integrar os corpos gerentes da sociedade.
Em 30 de abril de 1887, Clemente Menéres retira-se amigavelmente da sociedade da fábrica. Todo o ativo da extinta sociedade (então representado pela “Companhia Luso-Brasileira – Fábrica de Conservas Alimentícias” e pela pequena fábrica de salga e conservas de sardinha de Silvalde a sul de Espinho) passava para uma nova empresa de imediato constituída pelos quatro sócios e que passou a designar-se de “Santos, Cirne & Macedo”.
A partir de 1887 Clemente Menéres fará só empresas em família com os seus descendentes.
Uns meses antes da inauguração da linha ferroviária do Tua, a propriedade agrícola de Clemente Menéres em Mirandela estava estabilizada, tinha a produção organizada e apresentava resultados positivos, embora o escoamento dos produtos apresentassem alguns problemas devido à conjuntura depressiva que se fazia sentir nas praças comerciais.
Assim, no primeiro semestre de 1887, Clemente Menéres mandou arranjar os 5 andares da sua casa de Monchique no Porto, e ainda antes da inauguração oficial da linha (setembro desse ano), conseguiu um “comboio especial”, desde o lugar de Romeu até ao Tua, onde depois tomou outro comboio para o Porto, para transportar consigo a família, os operários e as máquinas para montar de novo a fábrica de rolhas num dos armazéns do antigo Convento de Monchique.
No segundo semestre de 1887, dada a necessidade de ampliar os seus negócios, Clemente Menéres organizou mostruários da sua produção própria e partiu de novo para o Brasil e rio da Prata a fim de arranjar novos clientes.
Clemente Menéres & Filhos (1888-1895) – Regressado do Brasil, em 1888 faz com os seus filhos, Alfredo e Agostinho, uma firma de domínio familiar designada “Clemente Menéres & Filhos”, integrando nesta todas as propriedades do Porto e de Trás-os-Montes.
O edifício do antigo Convento de Monchique foi ampliado, de forma a incluir a residência e as instalações para esta sociedade comercial, arrendando ainda a terça parte que não lhe pertencia. A parte oriental do antigo Convento passou a albergar as 2 principais atividades, a fábrica de rolhas de cortiça e o armazém de vinhos e de outras bebidas, com uma grande variedade de marcas e géneros, desde vinho do Porto, moscatel e malvasia e licores diversos, tanto de produção própria como de produção alheia.
Em 1890, esta empresa tinha 29 operários e 11 operárias durante todo o ano. Em 1891, na exposição industrial realizada no Palácio de Cristal (Porto), a sua participação na 2.ª classe de expositores relativa a produtos da indústria florestal, mereceu palavras de destaque no relatório final da mesma.
Anúncios em jornais, e outros de produção artística, apresentavam esta empresa como fornecedora da Casa Real e costumavam apresentar as referências relativas às distinções obtidas em exposições internacionais (Filadélfia 1876; Lisboa 1884 e Paris 1889), tanto mais que uma das marcas de vinho do Porto era a “Dom Luiz” com autorização expressa do rei D. Carlos I para o efeito.
Menéres & Companhia (1895-1905) – Em 1895, Clemente Menéres realizou a sua última viagem comercial à Palestina, Síria e Egipto.
Nesse ano a sociedade alarga-se também à filha Leonor e ao filho José (regressado de Inglaterra onde tinha estado a estudar), alterando novamente a designação para “Menéres & Companhia”. Assim, esta firma ficou constituída pelo pai Clemente e como sócios, 4 dos seus filhos.
Esta alteração surge na sequência das partilhas do primeiro casamento (pois a 23 de maio de 1893 faleceu a sua primeira mulher, Maria da Glória Guimarães da Cruz), aproveitando-se a ocasião para retirar da sociedade todas as propriedades transmontanas (que teve como consequência a redução substancial do capital de Clemente na empresa), que passam exclusivamente para o seu domínio. Mais tarde, retira-se da empresa lançando os filhos no meio empresarial, a primeira vez sozinhos numa sociedade comercial.
Mesmo com a retirada de Clemente Menéres, esta firma comprometeu-se a adquirir toda a cortiça da sua Quinta do Romeu em Mirandela e pagava-lhe uma renda pelas instalações de Monchique (enquanto lá esteve, pois teve esta sede no Porto e em 1899 muda-se para Matosinhos).
A “Menéres & Companhia” deu continuidade à exportação de vinhos para o Brasil, iniciando também remessas para as colónias africanas e aventurando-se noutros países europeus.
À medida que o volume das transações comerciais foram aumentando, a localização da “Menéres & Companhia” no antigo Convento de Monchique, foi-se revelando desfavorável à prática de alguns negócios, nomeadamente o da exportação de vinho, dada a proximidade da fiscalização aduaneira que frequentemente lhes causava alguns constrangimentos. Esta situação e a necessidade de expansão dos negócios leva esta firma a procurar um local, por um lado bem localizado e por outro, fora do alcance visual da fiscalização.
Clemente Menéres consciente disso e com a sua visão comercial, aproveitou a oportunidade da existência do primeiro “Plano de Urbanização de Matosinhos” (planta de projeção horizontal de parte da vila de Matosinhos, compreendida entre a praia dos banhos e o Castelo do Queijo, da autoria do Arquiteto Licínio Guimarães em 1886, que previa para o extenso e desértico areal do prado (hoje Matosinhos-Sul) a definição de uma malha ortogonal de arruamentos e quarteirões a serem ocupados por diversas unidades industriais), e resolveu construir aí armazéns (fora de barreiras aduaneiras) ocupando um desses quarteirões.
É neste contexto que surge em 1897 o projeto de construção do emblemático edifício da “Companhia Vinícola” em Matosinhos, da autoria do engenheiro António da Silva.
Em 1897, Clemente Menéres retirou-se da empresa que tinha com o seu genro Joaquim da Silva Barbosa, ficando este com a fábrica de cortiça em sociedade de comandita, mudando-a para a Alfândega Velha com a designação de “Barbosa & Companhia”, tendo como sócio José Menéres.
Companhia Vinícola Portuguesa (1899-1930) (até 1905 como parte da “Menéres & Companhia” com a designação social de “Companhia Vinícola”)
– Em 1899, Clemente Menéres transfere para Matosinhos, primeiramente os depósitos de vinhos até então existentes no antigo Convento de Monchique, e posteriormente os armazéns e oficinas da firma “Menéres & Companhia”, para esta instalação fabril (edificada entre 1897 e 1901) destinada à “Companhia Vinícola”. Esta Companhia negociava o vinho produzido do Romeu.
Tratou-se do primeiro complexo de cariz industrial a ser construído nessa vasta área no âmbito do Plano de Urbanização para a então designada zona do areal do Prado.
(O chamado Prado de Matosinhos ou Campo da Junqueira, era uma vasta área plana onde tinha estado, até há alguns anos antes, um hipódromo, e por onde corria em direção ao mar, a ribeira do Prado, que resultava da junção de duas mais pequenas com nascentes e percursos distintos, chamadas de Carcavelos e da Riguinha, respetivamente).
Este complexo era constituído por um conjunto de 8 edifícios, que se destacava das restantes construções edificadas posteriormente, por causa da sua estrutura inspirada nos modelos utilizados em Inglaterra para a composição das primeiras explorações agrícolas industrializadas, resultando num foco de atração para as futuras unidades industriais que posteriormente foram aí surgindo.
Era composto por diversos armazéns onde se procedia à rotulagem, embalagem e expedição de barris de vinho, um espaço laboratorial e uma tanoaria, considerada a primeira tanoaria a vapor existente na região (onde eram fabricadas as barricas). Agregava escritórios com máquinas de escrever, gabinete de provas e análises de vinho, armazéns de vinhos em semi-cave para garantir temperaturas baixas, incluindo uma cisterna especial e filas de tonéis com armazéns para os diversos tipos de vinhos, secção de engarrafamento de vinho, depósito de receção com bomba elétrica de trasfega ligada a uma rede de tubos, carpintaria mecânica, caldeira a vapor para acionar motores e um dínamo para produção de eletricidade.
O conjunto com cerca de 11000 m2, destacava-se assim das restantes construções industriais contíguas, pelas soluções fortemente inspiradas nos modelos ingleses, ocupando quase a totalidade do quarteirão definido atualmente pela Avenida Menéres a norte (toponímia em homenagem a esta família de empresários), pela Rua Sousa Aroso a sul, pela Rua D. João I a oeste e pela Rua Mouzinho de Albuquerque a este. Os edifícios, de planta retangular, dispunham-se a todo o perímetro do quarteirão, deixando no interior um enorme pátio, onde a linha férrea que fazia o transporte de vinho (em carros de tração elétrica de pequenos vagões), pela Rua Brito Capelo ao ramal do porto de Leixões, tinha o seu términus e onde se dispunham os dois armazéns/ depósitos ainda existentes.
Não há registos de que o edifício original tenha sofrido grandes alterações ao longo dos tempos, ressalvando-se apenas uma ligeira ampliação ocorrida em 1903, de que resultou a construção de um torreão num dos extremos da fachada voltada para a atual Avenida Menéres e Rua D. João I, e em 1929 registaram-se algumas alterações de cariz decorativo numa das fachadas do torreão, nomeadamente o painel de azulejos aí existente.
Em 1905, já com os filhos lançados no meio empresarial, Clemente Menéres sai deste negócio do Porto e dedica-se exclusivamente à exploração da cortiça, vinho e azeite do Romeu, ativando novamente a Fábrica de rolhas em Mirandela, no largo do Toural.
A 14 de janeiro de 1905 é extinta a sociedade “Menéres & Companhia” e criada a partir desta a “Companhia Vinícola do Porto”, uma sociedade por ações com sede no Porto, para onde passou todo o stock remanescente, tendo como diretor José Menéres e como presidente do Conselho Fiscal Alfredo Menéres (filhos de Clemente Menéres).
Esta empresa passou a comercializar marcas de vinho do Porto, vinhos espumosos e vinhos de mesa que saiam dos seus armazéns em Matosinhos.
Três anos mais tarde (1908), devido a um litígio com a “Companhia Vinícola do Norte de Portugal – Porto”, a firma passou a designar-se “Companhia Vinícola Portuguesa” (também conhecida como “Real Companhia Vinícola Portuguesa”).
Esta Companhia Vinícola faliu em 1930, já depois da morte de Alfredo da Fonseca Menéres em 1917 e do seu irmão Agostinho da Fonseca Menéres em 1926.
(Este edifício ficou assim votado ao abandono e consequente degradação. Funcionou ainda como refúgio/ albergue dos desalojados das casas demolidas junto às margens do rio Leça em Matosinhos e em Leça da Palmeira por causa da construção das docas do porto de Leixões. Várias décadas depois e na sequência da descolonização de 1974/75, voltaria a desempenhar as mesmas funções em relação aos retornados das ex-colónias portuguesas em 1975.
Em 1998, a Câmara Municipal de Matosinhos adquiriu o imóvel, em estado de abandono, tendo sido integrado no plano de urbanização de Matosinhos-Sul da autoria do arquiteto Álvaro Siza Vieira que pretendia nessa altura manter o edifício como pólo duma “praça maior”, propondo-se a construção de equipamentos de turismo e lazer no edifício.
No ano de 2008, funcionaram neste imóvel oficinas e salas de aula de disciplinas técnicas e práticas dos cursos existentes então na “Escola Secundária Gonçalves Zarco”, devido às obras de reabilitação da escola.
Em julho de 2013, este conjunto de 8 edifícios foi classificado como Monumento de Interesse Público, que também fixou a Zona Especial de Proteção (ZEP) do monumento.
Atualmente, neste edifício está instalada a “Casa da Arquitetura” inaugurada em novembro de 2017. Este projeto de intervenção foi da responsabilidade do arquiteto Guilherme Machado Vaz. Esta antiga unidade fabril possui, para além de zonas expositivas de arquitetura e seu tratamento técnico, também espaços para ateliers, biblioteca e auditório, acolhe a “Orquestra de Jazz de Matosinhos” num dos blocos do edifício, tem uma praça ao ar livre para restauração e lojas concessionadas.)
Gomes, Menéres & Companhia Limitada – Fábrica de conservas “A Varina” – “A Varina”, na cidade de Ovar, era uma fábrica a vapor de conservas de peixe, carne, frutas e legumes, da qual Clemente Menéres foi sócio entre 1903 a 1908, com o auxílio do seu filho Agostinho Fonseca Menéres.
Esta empresa, sediada no antigo Largo do Mártir S. Sebastião (atual Praça Almeida Garrett), inaugurou em 1905, durante a permanência em Ovar do filho Agostinho Menéres, uma sucursal num grande armazém de madeira, ao sul da praia do Furadouro, para a recolha e salga de sardinha capturada não só naquela praia, mas também, maioritariamente, na Torreira, S. Jacinto e Costa Nova. Para facilitar esse abastecimento, esta possuía uma lancha construída em “madeira de teca”, movida a motor, a qual rebocava, através da Ria até ao Carregal, os barcos provenientes daqueles portos piscatórios, carregados com a sardinha, que era seguidamente enviada para o seu armazém.
A anterior fábrica “Companhia Luso-Brasileira – Fábrica de Conservas Alimentícias” de conservas de peixe, carne e legumes, passou em 1903, por trespasse para esta firma “Gomes, Menéres & Companhia Limitada”, que assim ali instalou a fábrica a vapor de conservas alimentícias “A Varina”.
O sucesso foi imediato, pois no ano seguinte, a Câmara Municipal de Ovar, na sessão de 27 de abril de 1904, atribuiu a esta firma uma área arenosa situada a sul da praia do Furadouro para a construção de uma sucursal mais perto do mar, não exigindo qualquer retribuição.