A INDÚSTRIA DE CONSERVAS DE PEIXE NO ALGARVE (1865 - 1945)

Joaquim Manuel Vieira Rodrigues

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO EM HISTÓRIA CONTEMPORÂNEA – Lisboa 1997

INTRODUÇÃO

Objecto do trabalho
Cronologia
Metodologia
Fontes
Objecto do trabalho

O estudo que agora se apresenta é no essencial a nossa tese de Mestrado, apresentada, em Abril de 1997, na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Contudo, e dada a extensão do trabalho houve por bem expurgar algumas partes que consideramos dispensáveis para a sua compreensão. Também não inserimos os capítulos referentes ao movimento operário conserveiro algarvio, os quais, só por si, correspondem a uma outra obra.

O presente trabalho foi no início motivado por duas ordens de razões: uma de índole pessoal, visto ser natural do Algarve e querer dar a conhecer, com a minha modesta contribuição, aquilo que em tempos pretéritos foi uma das grandes potencialidades económicas da região. E que melhor maneira encontraria – e aqui reside a outra razão -, senão estudar aquela que foi a principal indústria implantada no Algarve, a par, aliás, da cortiça, e, durante décadas uma das mais importantes do país, na qual trabalharam muitos milhares de operárias e de operários, frequentemente desde a mais tenra idade, fonte de entrada de imensas divisas para a região e para o país e que contribuiu decisivamente para o desenvolvimento e alguma modernização da pesca: a indústria de conservas de peixe. É concomitantemente uma homenagem a todos aqueles, qualquer que tenha sido a sua condição social, que contribuíram para esta indústria. Ao longo das suas páginas daremos a palavra a muitos dos agentes históricos conserveiros que emergindo do pó dos arquivos e bibliotecas darão a conhecer as suas ideias e posições sobre o evoluir da indústria que contribuíram para engrandecer e quiçá para desaparecer…

Paulatina vimos presenciando a morte anunciada desta indústria no Algarve, e, quem sabe, se no país, visto que poucas unidades restam a nível nacional e, apenas, duas ou três, na região.

Cronologia
Este trabalho cobre um longo arco temporal, digamos que se inscreve na longa duração, desde 1865, data do aparecimento das primeiras fábricas, precisamente no Algarve, até ao final da II Guerra Mundial.

Contudo, o «núcleo duro» do trabalho centrar-se-á essencialmente durante o Estado Novo e nas suas políticas implementadas em relação ao sector.

É, pois, um estudo de incidência monográfica e regional, não extravasando a análise da indústria de conservas para uma perspectiva nacional, senão na medida do indispensável para um melhor enquadramento da situação que se pretendeu estudar.

Metodologia
O estudo que nos propomos realizar sobre a indústria de conservas de peixe incidirá fundamentalmente na conserva de sardinha de todas as produzidas a mais importante, quer do ponto de vista económico, quer do ponto de vista social.

Em algumas das fontes consultadas encontramos a referência a conservas de peixe não se descriminando os vários tipos que as mesmas incluíam. Assim, ao utilizarmos o termo conservas de peixe estamos englobando todos os tipos de conserva, nomeadamente as de sardinha e similares em azeite, óleo ou sal e as conservas de atum e similares igualmente em azeite, óleo e sal.

Este estudo é o primeiro e até agora único trabalho a tentar um esforço de interpretação sobre as grandes coordenadas da indústria de conservas do Algarve. A isso, também, se poderá ficar a dever as deficiências e insuficiências que possa conter.

Fontes
Para a elaboração da presente tese deparou-se-nos alguma dificuldade na recolha de elementos, quer quantitativos, quer qualitativos, situação algo paradoxal tendo presente a importância e o papel desempenhado pela indústria no contexto da economia portuguesa.

O arquivo do antigo Instituto Português de Conservas de Peixe que, certamente, disporá de abundantíssima informação, encontra-se completamente inacessível, e, infelizmente, assim deverá continuar por longos anos, revelando mais uma vez o total desinteresse das autoridades responsáveis por instituições que guardam um valioso património arquivístico para o conhecimento da história económica recente de uma das suas principais indústrias.

Quanto às fábricas, nomeadamente as do Algarve, poucas resistiram à decadência do sector, ao abandono e à incúria dos homens, apenas sobressaindo no recorte urbano as suas altas chaminés. Estamos em crer que pouco ou nada ainda restará dos arquivos dessas fábricas, a não ser que se possam encontrar na posse de algum particular ou noutra qualquer instituição, nomeadamente Câmaras Municipais da região, o que sinceramente duvidamos. Excepção honrosa aos mutilados arquivos das empresas Júdice Fialho e Feu Hermanos que puderam ser salvaguardados, embora não muito abundantes, onde foi possível recolher alguma informação de grande interesse.

Uma grande parte ainda do espólio da fábrica Feu, localizada na estrada da Praia da Rocha, Futuro Museu Municipal de Portimão, encontra-se quase completamente perdido, visto que muitos documentos certamente já desapareceram, enquanto outros encontram-se amontoados e abandonados ao pó, às intempéries e aos roedores. Numa visita que nos foi facultada pelo Centro de Documentação e de Informação de Portimão – ao qual queremos testemunhar o nosso agradecimento, designadamente ao Professor José Gameiro -, conseguimos recolher alguns documentos importantes utilizados no nosso trabalho.

Consultámos igualmente, com alguma dificuldade de acesso, o que resta do antigo Grémio dos Industriais de Conservas de Peixe de Sotavento do Algarve, ainda no edifício construído pelo respectivo grémio, cujo espólio original, grande parte do qual um amontoado de livros e papéis não devidamente tratados de forma a permitir uma profícua consulta o que dificultou o nosso trabalho de pesquisa, encontrámos alguns importantes elementos, nomeadamente sobre a exportação de conservas de todas as firmas do centro de Olhão, entre 1936 e 1945, assim como vários livros de actas daquele grémio. Aos seus responsáveis o meu mais sincero agradecimento pela possibilidade que me concederam o acesso aos seus arquivos.

Com bastante proveito foi a consulta ao Boletim do Trabalho Industrial com elementos de interesse, nomeadamente sobre as primeiras décadas da indústria conserveira.

No Banco de Portugal consultámos os Relatórios trimestrais das suas agências, penso que utilizados pela primeira vez no que diz respeito ao Algarve, onde se colheram preciosas informações sobre as indústrias da pesca e das conservas.

Uma substancial informação retirámo-la de jornais e revistas de âmbito nacional e regional, neste último caso publicados nos principais centros conserveiros com destaque para Olhão. Infelizmente, uma percentagem significativa dessas publicações regionais, algumas de boa qualidade informativa, não tiveram continuidade, obstando, deste modo, ao prosseguimento do estudo e da consequente análise de temas que ficavam bruscamente cortados.

Nenhum dos centros conserveiros algarvios, à semelhança, por exemplo, de Setúbal e Matosinhos, dispôs de qualquer órgão do próprio sector, quer patronal, quer operário.

A relativa complexidade de funcionamento da indústria de conservas terá de alguma forma contribuído para que alguns aspectos não tenham tido a profundidade de análise necessária. Muitas outras vertentes terão ficado à margem do estudo esperando que outros investigadores sobre eles se debrucem.

Este trabalho não seria possível sem a contribuição de algumas individualidades. Ao Professor Doutor Fernando Rosas que com o seu apoio, incentivo, orientação e competência científica contribuiu de uma forma imprescindível para a sua concretização.

Palavras de estima e consideração para o Doutor Carlos Albino, que também não deixou de dar a sua prestimosa colaboração, sábias opiniões e apoio durante o trabalho.

Igualmente uma palavra de grande estima e consideração para a Doutora Maria Margarida Vargues, da Universidade do Algarve, que sempre solícita me facilitou a consulta de várias obras requisitadas da Biblioteca Nacional.

É, pois, tempo de estudar o longo percurso desde a segunda metade do século XIX até ao fim da II Guerra Mundial e analisar as várias fases – de esplendor e de miséria – que atravessou a indústria, as suas potencialidades, as suas debilidades e alguns dos protagonistas – proletários e capitalistas -, que contribuíram para a sua história.

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