A Exposição Internacional do Centenário da Independência: Modernidade e Politica no Rio de Janeiro do inicio dos anos 1920.

Sant’Ana, Thaís Rezende da Silva de A Exposição Internacional do Centenário da Independência: modernidade e política no Rio de Janeiro do início dos anos 1920/. Thaís Rezende da Silva de Sant’Ana- Campinas, SP : [s. n.], 2008.

RESUMO

A Exposição Internacional do Centenário da Independência do Brasil, realizada no Rio de Janeiro em 1922, foi o maior evento republicano do início do século XX. Visitantes e autoridades de todo o país e do mundo foram atraídos à essa primeira exposição internacional brasileira, organizada pelas elites nacionais como espécie de vitrine para exibir os avanços do país – do ponto de vista industrial, econômico e social – e afirmar a identidade da nação no ano em que era comemorada a emancipação política brasileira. O certame ainda motivou uma série de transformações no espaço urbano da então capital republicana; impulsionou o emprego de novos materiais e técnicas de construção, agregou grande valor aos arquitetos e consagrou o neocolonial como o “estilo nacional”. A ocasião do Centenário da Independência do Brasil favoreceu a instauração de um ambiente que incentivava autocrítica entre as diversas camadas sociais do Rio de Janeiro. As idéias que surgiram desses questionamentos repercutiram nas mostras exibidas no certame de 1922. Porém, não houve na historiografia oficial o reconhecimento da Exposição do Centenário como acontecimento relevante para uma melhor compreensão das mudanças e transformações sociais, políticas, econômicas e culturais que marcaram a primeira metade do século XX brasileiro. Por muitos anos, tal historiografia tendeu a associar a manifestação da modernidade no Brasil à cidade de São Paulo e à Semana de 1922, reduzindo esse complexo e contraditório movimento a apenas uma de suas manifestações. A presente dissertação vem evidenciar a influência da Exposição Internacional do Centenário no movimento da modernidade brasileira. O evento é aqui apresentado como a própria materialização da efemeridade modernista de seu tempo; cenário onde estavam dispostas imagens e ideais políticos, econômicos, culturais e urbanos que caracterizavam aqueles agitados anos do início da década de 1920 no Brasil.

ABSTRACT

The 1922 Rio de Janeiro International Centennial Exhibition, was the largest event of the republic in the beginning of the 20th century. Nation and worldwide visitors and authorities were attracted to this first Brazilian international exhibition, organized by the country’s elite, as a means to demonstrate the advancements of the country – through an industrial, economical and social point of view – and to ratify the identity of the nation in the year that the Brazilian political emancipation was celebrated. The exhibition motivated a series of transformations to the urban space of the former capital of the republic; it also stimulated the application of new materials and techniques of construction, added great value to the architects and established the neocolonial as the new “national style”. The atmosphere of the Centennial of Independence of Brazil favored the development of an environment that promoted self –criticism among the various social classes of Rio de Janeiro. The ideas which emerged from such self-criticism had repercussions in the various displays of the exhibition of 1922. However, there was no recognition of the 1922 Rio de Janeiro International Centennial Exhibition in the official historiography as a relevant event to a better understanding of the social, political, economical and cultural changes and transformations that marked the first half of the 20th century in Brazil. For many years, such historiography was inclined to associate the manifestation of modernity in Brazil to the city of São Paulo and to the Week of 1922, reducing this complex and contradictory movement to only one of its manifestations.This thesis shows evidences of the influence of the 1922 Rio de Janeiro International Centennial Exhibition in the movement of modernity of Brazil. The event is presented in this study as the actual materialization of the modernist ephemerality of its time. That setting displayed a series of images and political, economical, cultural and urban ideals which characterized the turbulent years of the beginning of the 1920s in Brazil.

“Para a participação de Portugal na Exposição do Centenário dois pavilhões foram construídos na Avenida das Nações: o Pavilhão de Honra de Portugal e o das Grandes Indústrias de Portugal, ambos idealizados por arquitetos portugueses ao estilo D.João V – evidenciando elementos tradicionais da arquitetura portuguesa que tinham correspondentes na arquitetura colonial brasileira. O projeto do Pavilhão das Grandes Indústrias de Portugal foi desenvolvido especialmente para a ocasião por Ricardo Severo, engenheiro já extremamente valorizado pela colônia portuguesa. Assunção dos Santos e Rebello de Andrade projetaram o Pavilhão de Honra de Portugal buscando “ressaltar o esplendor da época áurea em que foram construídos em Portugal suntuosos palácios e primores da arquitetura religiosa”237. O escultor Costa Mota fez a parte decorativa dos pavilhões; Leal da Câmara pintou as barras decorativas dos torreões e galerias de arte aplicada, além de ornamentar os dois pátios.

Foram expostos nos dois edifícios pinturas de indústrias e escolas mantidas pelo governo português, além de representações das colônias portuguesas. Produtos e demonstrações dos mais variados ramos – com destaque para a indústria têxtil, de lanifícios e de algodão – também foram exibidos:

“(…) toda a atividade industrial representada pelos diversos grupos de extração, transformação e adaptação se apresenta, não com a idéia preconcebida da conquista dos mercados mundiais, mas necessariamente com o fim de mostrar que Portugal é um país progressivo, trabalhador e que tem o direito de gozar da sua plena e absoluta independência na sociedade das nações”

 Guia Oficial da Exposição Internacional do Rio de Janeiro em 1922

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“Houve uma série de acontecimentos muito celebrados no recinto do certame; o primeiro vôo Rio de Janeiro – Nova York, realizado pelos aviadores Hinton e Pinto Martins, e o primeiro vôo interestadual São Paulo – Rio de Janeiro pilotado por uma mulher253 são alguns exemplos. A inauguração do Parque de Diversões, em 22 de novembro, foi outro evento animadíssimo: atraiu cerca de 40000 pessoas levando o parque a fechar as portas somente às 4 horas do dia seguinte254. Porém, nada se compara ao sucesso da visita do presidente de Portugal, Antônio José de Almeida à exposição. Este foi certamente um dos dias mais movimentados da grande feira. O povo aglomerou-se no recinto para ouvir e aclamar, com alegria e admiração, o presidente português.

Além da excelente acolhida popular, Antônio José de Almeida recebeu homenagens de ministros, deputados brasileiros e também de organizações portuguesas estabelecidas no Brasil.

Em um de seus pronunciamentos, o presidente português declarou:

“A palavra ‘Brasil’ é uma espécie de moeda de ouro sempre cunhada de fresco, que reteve o timbre metálico da riqueza e da fortuna. Proferi-la é fazer a evocação fascinante de pedrarias a rolar, em montões, de tesouros encantados a faiscar sobre a luz. O dicionário dos mundanos podia trazê-la como sinônimo de ‘magnificência’; o dicionário dos emigrantes podia atribuir-lhe, burguesamente, o nome de ‘opulência’. Mas a palavra ‘Brasil’ tem para mim, uma expressão mais nobre, que ostenta todas as características de força e todos os esplendores da beleza, os mais vivos anelos dos sentimentos e os mais surpreendentes clarões do espírito, porque traduz este atributo, já hoje famoso: o gênio dos brasileiros”

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A presença portuguesa na exposição também colaborou para respaldar as “origens” da nação brasileira. Portugal participou do certame brasileiro ocupando dois pavilhões, ambos na Avenida das Nações, sendo um deles “de honra”. Tal participação se mostrou, no mínimo, interessante. Era como se o Brasil estivesse nascido junto com a colonização portuguesa:

“Nobres e fortes, Portugal e Brasil, pai e filho, eram um só. Unidos sob o mesmo espectro, viviam sob o mesmo governo, tinham as mesmas leis, guiavam-se pelo mesmo leme. Um dia, as contingências, as necessidades separaram esse todo, tornando-o em dois, como o Oceano e as lagoas. E daí em diante , como estes divididos pela terra , ficaram os dois separados pelo Atlântico, mas chamando-se eternamente um ao outro, nos gritos do sonho e do sangue.
No Discurso Magistral com que saudou o Congresso, na sua visita ao Monroe, o presidente Antônio José de Almeida definiu, com seu verbo de ouro e de fogo, as necessidades, e, sobretudo, a oportunidade daquela separação. Portugal era, então, o atleta fatigado,que não podia ter mais nos braços o filho que a idade robustecera. Para que lho não roubassem, deixou então, que este fosse por si mesmo, antes que os inimigos lho arrebatassem, escravisando-o. E foi com olhos de pai que o viu crescer, desenvolver-se, robustecendo-se dia a dia, até que o tornou seu companheiro, seu amigo, seu irmão. 
(…) Percorrendo, no pavilhão português, as coleções soberbas, em todos os ramos em que se desdobraram florindo e frutificando, a sua cultura e seu gênio, todos nós sentimos o orgulho de ser, na terra, um rebento daquela árvore maravilhosa. É seu o nosso porvir. O seu passado é nosso “

 A Exposição de 1922; Órgão da comissão organizadora, nº18, 1922

O trecho em destaque acima, publicado na revista Exposição de 1922, confere afetividade às relações entre Brasil e Portugal. Não há nenhum indício da imagem de metrópole exploradora ou da colônia oprimida; tem-se a descrição de Portugal como o “pai protetor” que, ao ver seu filho forte e robusto, opta por deixá-lo crescer sozinho. Como afirmado no trecho, a História de Portugal fora assumida como parte da História do Brasil na Exposição do Centenário. Tal fato dá indícios de que o Brasil de 1922, independente e descolonizado, permanecia fortemente influenciado pelos valores europeus e seus paradigmas.

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