A INDÚSTRIA DE CONSERVAS DE PEIXE NO ALGARVE (1865 - 1945)

Joaquim Manuel Vieira Rodrigues

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO EM HISTÓRIA CONTEMPORÂNEA – Lisboa 1997

V - A CRISE DO PÓS GUERRA - OS APELOS DOS INTERESSES CONSERVEIROS ALGARVIOS

1. A movimentação das «forças vivas» conserveiras algarvias

As exportações de conservas de peixe após a I Guerra Mundial cresceram e valorizaram-se num contexto caracterizado por déficits crónicos, de grandes aumentos dos preços e da taxa de câmbio que iam minando aceleradamente o valor interno e externo da moeda portuguesa. Desvalorização do escudo que, aliás, contribuíra para uma maior procura de produto nacional e pela maior competitividade dela resultante.

Teria sido a valorização do escudo que trouxera à «economia nacional os mais graves prejuízos lançando a desordem no comércio e comprometendo sèriamente a nossa indústria» [275], essencialmente, a partir de 1924, para fazer frente ao gravíssimo problema financeiro que o país atravessava, que provocara uma séria quebra nas exportações das nossas conservas, agora menos competitivas nos mercados externos, iniciando uma recessão que se prolongaria por vários anos.

[275] M. Caetano, A Depreciação da Moeda depois da Guerra, pp. 353 e 354.

A reforma financeira, iniciada por Álvaro de Castro e prosseguida por Rodrigues Gaspar parece não ter deixado satisfeitos poderosos interesses económicos. Os protestos não se fizeram esperar: «O movimento parte da Associação Comercial de Lisboa, que reúne os principais prejudicados com a valorização do escudo e a queda do comércio externo» [1] .

Aos protestos juntam-se igualmente a Associação Industrial Portuense, a Associação Industrial Portuguesa e a Associação Central da Agricultura. Todo este movimento desaguará na constituição, em 28 de Setembro de 1924, na União dos Interesses Económicos, na qual a componente declaradamente de intervenção política estava presente[2].

Paulatinamente, em consequência da crise económico-social e política, atravessada pelo país, mas, num contexto mais amplo, crescia e organizava-se uma corrente de características anti-liberais, propondo um novo tipo de soluções para os problemas que enfrentava a sociedade.

Como reagiram, pois, as «forças vivas» das conservas do Algarve a uma quebra da exportação das conservas de sardinha, que entre 1924 e 1926 atingiu 29% e 48,4%, respectivamente, em quantidade e em valor?

Perante esta derrocada, os sectores sociais, patrões e operários, dependentes da indústria conserveira movimentaram-se em pânico.

Ora, a relação de dependência externa da indústria de conservas atingira um grau elevadíssimo. Quando se conjuga dependência externa e concentração geográfica também ela elevada, maior será a vulnerabilidade dessa indústria às flutuações conjunturais do mercado.

À crise económica advém a crise social, tanto mais dramática, quanto maior for a absorção da população industrial num só sector.

O «cerco e aniquilamento» a que esteve sujeita a República no seu estertor, e, apesar de alguma melhoria dos seus índices económicos, impossibilitou quaisquer medidas de ultrapassagem da crise.

[1] António Telo, “A Economia da República”, História de Portugal, dirigida por João Medina, vol. XI, p. 235.
[2] Oliveira Marques, “A Sociedade e as Instituições Sociais”, Nova História de Portugal, vol. XI, cap. VI, p. 232 e 233.

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