Fábrica de Conservas Marie D`Anjou - Santa Maria

NOME EMPRESA / COMPANY NAME: Fábrica de Conservas Marie D`Anjou – Santa Maria

NOME FÁBRICA / FACTORY NAME:

PROPRIETÁRIO/OWNER:

FUNDAÇÃO / FOUNDED: circa 1930

LABOROU EM/WORKED DURING:

ENCERRAMENTO / CLOSURE:

Nº EMPRESA IPCP/ IPCP COMPANY Nº:

ALVARÁ / CHARTER:

MORADA / ADDRESS: Santa Maria

CIDADE / CITY: Açores

NO MESMO LOCAL FUNCIONOU/AT THE SAME LOCATION WORKED:

OUTROS LOCAIS / OTHER PLACES:

TIPO / TYPE: Packers of canned fish in olive oil

FONTES / SOUCES:

FÁBRICA DE CONSERVAS MARIE D’ANJOU

Santa Maria já teve uma dinâmica muito mais forte do que aquela que a motiva na atualidade. Ainda antes de os americanos terem vindo para cá dar um novo fulgor à economia, com a construção de um aeroporto e com toda a atividade conexa que isso motivou, já outras empresas se tinham aventurado, tirando partido dos ótimos recursos naturais do nosso mar. Já se tinham criado empresas de caça da baleia, sociedades por quotas que em nada destoaram das suas congéneres e, para exploração dos nossos recursos endógenos, como é o caso do barro, que era exportado para outras ilhas e usado por cá, diversas olarias se construíram.

Por incrível que pareça, Santa Maria está cada vez mais votada ao esquecimento. Pouca gente se lembra que também existiu nesta ilha uma Fábrica de Conservas Marie d’Anjou, à semelhança da sua congénere na Calheta de S. Jorge, que vai ser adaptada para albergar o Museu Francisco de Lacerda.

Não consegui ainda averiguar o ano de início dessa atividade. Calculo que tenha sido no princípio da década de 1930.

Inicialmente essa fábrica, que funcionava no Terreiro, quase em “cima da rocha”, na atual casa do senhor Luís Leandres, foi propriedade de E. Garazo Quintela Mendonça, pai de E. C. Mendonça.
Quando E. C. Mendonça se cansou deste negócio, trespassou-o a um suíço de nome Jean Sountier. Este senhor parece ter caído nas graças dos residentes da ilha. Foi grande o número de homens e mulheres que ali conseguiram emprego. Há uma fotografia que circula na internet que é prova disso. Conseguiram juntar nessa fotografia um grupo de cerca de cinquenta pessoas, senhoras com batas e lenços brancos na cabeça e homens bem trajados a que só faltavam os sapatos, ainda não muito vulgarizados. Nessa mesma fotografia está: o senhor José da Trindade Henriques da Silva, latoeiro, pai de Natália Silva Paiva, que ali trabalhou antes de ingressar na Mobil; o senhor Pessanha, de nome conhecido por alguns marienses mas que pouca gente conhece; o senhor José Leandres de Chaves, que seria um dos administradores; o senhor João Augusto Baptista, que se supõe ter sido o guarda-livros da empresa, cumulativamente ou não com a loja de ferragens que tinha na Vila; e outras pessoas para já desconhecidas da atual geração.

A empresa estava bem estruturada. Porém, também derivado à escassez de água de rede, ainda com tubos de barro, era grande a pestilência que exalava daquela zona. Os restos de peixe eram padejados por cima dos muros para a carrinha que os transportava para as lixeiras, o que dá para imaginar a grande porcaria que se gerava, que não era de modo nenhum impeditiva do funcionamento regular da fábrica. Os resíduos do material usado na confeção das latas de conservas eram todos despejados, a céu aberto, no exacto local onde, mais tarde, haveria de ser construído o matadouro municipal, já desativado. Era um local ideal para as crianças, de pé descalço, procurarem alguma coisa para usar nas suas brincadeiras. As duas camionetas também serviam para transportar os trabalhadores de S. Pedro, Santana e outros lugares onde eles moravam e que estacionavam no parque com acesso pela Rua do Livramento, na traseira do edifício.
Além do emprego direto, havia mais gente que lucrava com a empresa. Era o caso do Mestre José de Medeiros, marceneiro, irmão do Mestre Alberto que fazia os caixões cá na Ilha. Era o mestre José de Medeiros que confeccionava as embalagens em madeira onde se exportavam as latas de conserva em óleo de oliva ou em salmoura para as grandes cidades europeias.

Mas houve um percalço que veio modificar o dia a dia da fábrica de conservas. Em 25 de Maio de 1955 o barco “Santa Maria”, que trabalhava na captura do pescado, tinha ido a S. Miguel fazer uma revisão ao motor LATHROP de 50 HP. No regresso à ilha desapareceu completamente, nunca se tendo sabido o que lhe aconteceu.
A tripulação era constituída pelo senhor Manuel Soares Figueiredo (o mestre), mais conhecido por Manuel da Luísa, nascido em 8 de maio de 1898; pelo seu filho António Travassos Figueiredo, mais conhecido por António Bombeia, nascido a 24 de abril de 1917, que deixou viúva a senhora Guilhermina Bombeia e 10 filhos menores; e Alfredo Coelho Branco nascido a 29 de janeiro de 1922 e que também deixou uma viúva e três filhas menores. Tinham dado boleia ao jovem Adelino Baptista Travassos, que se encontrava a prestar serviço militar em S. Miguel. Este era filho do Sr. Carlos Ancia Travassos, barbeiro de profissão e pai do Mestre Carlos da Conceição Baptista Travassos.
O Mestre Carlos Barbeiro, pai de um dos passageiros desaparecidos, suspeitava que o barco tivesse sido capturado pelos comunistas, à falta de melhor explicação. Ou mesmo por um submarino, segundo outras versões…
Tinham-se criado laços de amizade entre os proprietários da fábrica, os trabalhadores e as gentes humildes daquela zona. Muitos dos trabalhadores e toda a gente ligada à faina da pesca, por conta própria, tinham vindo da Madeira. Alguns conseguiram emprego noutras empresas da ilha. Outros acabaram por emigrar, entre eles alguns dos “Palavras”. Não para os Estados Unidos nem Canadá mas para a Suíça. Iam quase sempre com um contrato de trabalho conseguido com a influência de Jean Sountier e acabavam por lá ficar. A mim intrigou-me sempre esse tipo de emigração para um país que não reconhecia como tendo ligações a Santa Maria. Nunca percebi por que motivo a senhora Guilhermina tinha emigrado para a Suíça com uma família tão grande. Nem como há esta forte ligação a um país que não nos diz quase nada. Nem como alguns dos meus amigos de juventude emigraram para lá sem saberem nada desse país.

Suponho que a exploração da Fábrica de Conservas Marie d’Anjou terminou lá por volta de 1960, altura posterior ao início de atividade da Fábrica dos Anjos, uma iniciativa do senhor José Salvador, que a abandonou quase logo de seguida.
1/5/2020 Rosélio Reis

 
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